Entre a quinta e a nona

E eu que falava das sinfonias de Beethoven

Não tinha pensado apenas naqueles cabelos vermelhos quando abri a boca para falar

Ou naquele sorriso que brotava por entre rostos no mundo

Como uma flor solitária brota em meio a calçada

Ainda que perder meus olhos entre seus traços fosse inevitável

Naquele momento em que falei

Tinha a plena consciência de que

Existe em uma sinfonia algo além de notas que possam ser escutadas

E em uma pessoa

Algo além de traços que podem ser vistos

E talvez fosse por isso

Por existir algo

Inaudível e silencioso

Incompreensível e oculto

Que tudo me soava tão belo.

Foi por não entender

Que entre oitavas, quintas, quartas justas e rostos expostos

Existe tanto mais que não se pode ver ou ouvir

E que a mente não ousa compreender

Que um dia falei como um tolo das sinfonias de Beethoven

Mas foi rápido perceber

Num lapso de milésimos de um piscar dos olhos

Que existia alguma coisa ainda mais bela entre aquele rosto e a simples existência do ser

Do que jamais existiu entre a quinta e a nona.

Algo que me fascinava

Mas não dizia nada

Não explicava nada

E nem queria.

Não tentei compreender.

É sempre cedo demais.

Mas talvez... haja tempo.

Me siga no Instagram: @opoetavaladao