O meu sangrar
(pra ler ouvindo Pelo Interfone - Cícero)
as trapaças de uma paixão
me colocaram presa
perdida e sangrando
como uma indefesa princesa de conto de fadas
na escuridão de sua torre
sozinha
trazem-me o choro e a solidão
o peito aberto e ardido
uma respiração ofegante de dor
olhos marejados de tristeza
uma mente inquieta que me apavora
um corpo que treme
meu sono ansioso
consequência da vida adulta que rasga
e queima
e machuca
o sono ansioso da ânsia por amar
e simplesmente ser amada
revisto-me de uma aura compressiva
paciente
que procura entender que
amar é deixar ir
amar é deixar ser
amar genuinamente
mas, ambígua
humana
meu desejo arde em possessão
em abraço casa que não solta
em carinho na barba
enquanto ele deita e dorme em meu peito
é como se em nossos carinhos
no arranhar da unha na pele
os sangues se fundissem
e em mim, passasse, então
a morar o seu desespero
aquele de Gustave Coubert
é como se em minha boca
ainda estivesse o gosto da saliva
do beijo profundo que ele me dá
quando o tesão o faz faiscar
e a saliva escorre da boca
e percorre voraz por meu corpo
é como se a dor dele
doesse em mim
minhas costas doem
e minhas vértebras necessitam
daquela corrida de nascer do sol
que traz força pro dia
preocupo-me com ele
que me afeta
me consome
me tira pra dançar
pra andar
ser viva
e talvez precisemos mesmo de um tempo
pra nos entender
pra saber sermos sós
sermos únicos
sermos juntos
sermos nós
mas é de certo
que só o que sei é que
toda sensação de perda
vem da sensação de posse
e o amor
não deveria machucar tanto.