enganos

não há maneira de esquecer um amor genuíno

pois o esquecimento é um limbo sem raízes

perde-se em sua própria insignificância,

cotidiano vão.

o amor genuíno que se viu atrás de uma porta trancada

inerte após uma palavra enviada

pálido diante de um flagra

daqueles olhos esquivos que já significaram o mundo inteiro

ah, este amor, que perdeu as folhas não pela chegada do outono

mas pela brutalidade tortuosa de um incêndio

este amor não pode ser esquecido.

sufoca-se, dia após dia, nas ordinariedades

estresses e inquietudes de um viver banal.

esconde-se, criminoso, no terrível pique-pega autoimposto

no comprimido à beira da cama

na noite de álcool e luzes que mimetizam o infinito.

rasga o tecido do palco naquela música exata

naquele poema desgraçado

na lembrança que vem sem causa, na idiotice da quebra de um copo

num riso familiar no trem

ah, maldita, maldita seja sua genuinidade

que faz o sangue correr grosso nas artérias

o pulmão pressionado no abismo torácico

que transforma a realidade num nada completamente inútil

cada acordar pior que o outro

todas as palavras terrivelmente insinceras

até que, entre os lençóis de outro,

encontra-se em frangalhos irreconhecíveis

e, sem identidade própria,

parece ser algo que não mais é.

e assim parece que não era amor

para justificar o bater de um coração já morto

oferecer um novo caminho aos pés quebrados

no eterno labirinto do engano

de fingir que o genuíno nunca existiu.

Zéfiro Alves
Enviado por Zéfiro Alves em 03/10/2019
Código do texto: T6760561
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