GALOPE TRIUNFAL

Daquele amor atrofiado e triste

de paredes tomadas pelo mofo,

de voz trêmula e opaca,

de andar cabisbaixo, surrado.

Parecia membro amputado,

de alma coalhada e distante,

vivendo num marasmo febril,

descarrilhado da razão,

carniça desprezada pelos urubus.

Outrora tinha asas, tinha raça, tinha sangue,

outrora esbanjava temperos e gostos,

outrora era atalho, era voo feliz,

outro era fruto preferido de Deus.

Mas o tempo destituiu o enredo original,

descoloriu sua varanda,

desaguou seu suor,

desfez cada pétala que teimava em sorrir,

em abraçar, em fecundar.

Mas, apesar de tudo,

ainda guardava o cheiro original

num canto qualquer do seu chão.

Cheiro já mordido pelos ventos,

já chicoteado pelos gomos do desprezo,

já enferrujado pelos sinos do desquerer-bem.

Certo dia, esse cheiro puído,

se deu conta de que ainda tinha chamas a rimar,

ainda tinha alma a sacudir,

ainda tinha colo aquecido a acariciar.

Daí o grão virou farto pomar,

o podre virou ventre divino,

o tumor virou bênção plena,

o traste renasceu amor com todos seus encantos,

com toda sua bravura,

como todo seu galope triunfal.

Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 24/09/2019
Reeditado em 15/05/2021
Código do texto: T6752449
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