Abutres
Essa melancólica que escorre pelos seus olhos
Esse pus sentimental gangrenoso
Me enche tanto de alegria que fico nervoso
com esse sentimento estéril seboso.
Meu olhar de apaixonado de quem tem um tumor cerebral
Um paciente esperançoso recebendo boas notícias de Estado terminal
Minha alma anoréxica presa nesse corpo obeso.
o desequilíbrio na navalha bamba.
É só a metáfora mais simples nessa dança do bambolê.
confie que os lobos vão alimentar nossas crianças.
E que corvos os farão ver mais arrancando seus olhos.
que as hienas os empoderarão lambendo seus ossos.
que os abutres vão santificar sua carcaça
que a cidade vai amamentar nossos recém nascidos.
Com esguichos de fumaça.
que quem tem poder vai ouvir seus gritos famintos, infindos.
que todas as conquistas não serão perdidas
no vazio do tempo, esquecidas.
é tão bom ter esse otimismo racional
que o pus dos seus olhos já mencionado
faz parecer normal
que eu já esteja acostumado
com os vermes que habitam o meu espírito.
A gente oferece tanto sorriso pra turista,
nega tanto aplauso pra artista
em atitudes tão mesquinhas
que me dá até preguiça de tentar rimar as primeiras linhas.