Pássaro-Sol

Passeava-se em meio a caixa do nada,

Que de nada tinha tudo,

Caixa essa consagrada,

Mas era cego de tão imaturo,

Prematuro em saber como a vida tende a empurrar,

Mas sem medo e sempre a teimar,

Procurava tanto a luz em meio a escuridão que esquecia de se achar.

Ei de conquistar um mundo que Deus lhe fez o próprio farol,

O centro do seu próprio universo, o Pássaro-Sol,

Cortava rispidamente como o cerol,

Apesar de cheio de vida só sentia cheiro de formol,

Desgrudado a qualquer carne fagulhava ao destino,

Fazia de teu próprio canto seu hino,

Indo,

Vindo,

Sorrindo.

Perdendo,

Sofrendo,

Se querendo,

O famoso tento.

Asas de leste a oeste,

Fogo que afugenta qualquer peste,

Voava até o norte,

Caminhando com a Morte.

Cobria o mundo com a própria asa,

Debaixo de Deus e sua capa,

Enquanto a vida lhe contra ataca,

Ele sobrevive a toda e qualquer estocada.

O único problema era o coração do Pássaro-Sol cheio de rancor,

Carregado de tanto ódio que sentia a própria dor,

Mesmo que Deus carregasse sua alma de temor,

Toda a onipotência não podia lhe trazer o merecido amor.

Piava e contraia,

Preso pela sua própria tirania,

Fogo fátuo que tudo queimaria,

Só precisava que o destino lhe sorriria.

Ela pássaro de chamas pálidas que queimava como gelo,

Mais quente que qualquer animal de pelo,

Pelo que ardia parecia uma explosão,

Consumava toda agonia em seu coração.

Pássaro de penas brancas e azul cerúleo,

Amá-lo era um desafio hercúleo,

Quem chegasse em casa de madeira era queimado por completo,

Quando o aconchego não chegava, tentavam afoga-lo no concreto,

Concretizando com que tua modéstia virasse teimosia,

Da tua devoção atropelada virasse heresia,

Seu corte como faca era apenas cortesia,

De toda confinada eterna alegria.

Quem diria.

Um universo inteiro a ser de explorado e seu coração não bombeava,

Era a obra mais completa do divino que não se completava,

Incompletamente competente, de coração doente que não se amava,

Até onde iria ver tal pássaro preso em sua própria matraca.

Voava pairando suas asas em todo o universo celestial,

O céu era seu mundo preso em liberdade condicional,

A única condição que o faria ser sensacional,

Era alguém faze-lo abaixar a cabeça de tom reverencial.

Ultima vez que botou seu bico ao chão foi a procura do celeste,

Buscando resposta por aquele que lhe fizeste,

Fora a vez que tua pena da asa tocara o chão,

Fora a vez que chorou sangue em busca de emoção,

O Pássaro-Sol não tem medo de fazer tudo queimar,

O Pássaro-Sol não tem dó de fazer tudo se frustrar,

Ele nunca poderia ter medo se um dia tudo lhe fora abandonar,

Ninguém deveria tira-lo de si mesmo nem mesmo se tentar.

De garras douradas jaze inveja por sua perseverança,

Dada de tua paciência a eterna aliança,

Tende a todo tempo do mundo por uma única oportunidade,

Oportunidade essa que poderia ser quem era de verdade,

É a incógnita de singularidade,

De qualquer mundo a linda calamidade.

Tem poder de renovação a velhos costumes,

Tem movimento para passear novos cardumes,

Balança vento para subir pássaros em queda vertical,

Tem visão para enxergar o outro lado da horizontal,

Por um pássaro do tamanho do universo aonde ele guarda tanto potencial.

Parceira maravilhosa que encontra tudo aquilo que essa chama oferece,

Que mostra a luz de si mesmo e que nada nunca o merece,

Do próprio algoz renova e perece,

Uma vez em cada vida o Pássaro-Sol aparece.

Do bico arranca vísceras da vítima infortunada,

Voa mais alto de uma obra inacabada,

Plana em si vento que o torna em eterno declínio,

Seria mais bem amado se não fosse tão cínico,

Mas faz tudo parte do seu eu lírico,

Pelo menos nunca se baseou no empírico.

O Pássaro-Sol deveria ser símbolo de força a qualquer criatura que lhe transpassa,

Mas andou tão destruído que mal se via sua carcaça,

Ele só precisava recuperar sua graça,

Para que a maldição de si mesmo se desfaça,

Não adianta, falcão, gavião, garça,

Independente do que lhe façam ele não cai em falácia.

Após eternos anos tal ser recuperou sua confiança,

Só precisou tomar duas alianças,

E em meio de tormenta,

Ele é alma ciumenta.

Único pássaro que pousa em retorno à Morte cadavérica,

Sente que do fim das coisas há alma poética,

Mesmo sendo uma eminencia eclética,

Não há de ser nunca mais ave cética.

O Pássaro-Sol passou por momento de transformação,

É senhor da sua própria ação,

Não há destino que o dê um não,

Precisou de vidas eternas para perceber a falha na equação,

Sua majestade e requinte são de sua criação,

Teu poder de sua própria canção,

Teu choro, tua felicidade de sua própria emoção,

Quem mais precisava dele era ele que fazia-se menção.

Pior é quando o demônio riu de teu olho azul,

Carregou tal besta de norte ao sul,

Rasgou teu crânio e fez sangue sair até de corno,

Quem diria que o diabo seria inimigo de um corvo.

De teu pouso fez chão o peito do endiabrado,

Teus olhos agora vermelhos rodopiando em sentido pirado,

Era ele quem se encontrava endemoniado,

Seu íris girava tanto em ódio que se sentia alimentado,

Cada passo,

Um rasgo,

Um trapo,

Um traço,

Queria tanto arrancar pedaço,

De tua asa saiu braço,

De teu bico boca de dentes enfileirados,

De tua asas mãos de unhas cravadas,

O cóccix estendia calça que enrolava,

A pele vinha em arranhados,

A garganta em respirações pesadas,

Os ossos até a alma tudo se quebrava.

Era o ódio mais gostoso em justiça alada,

Que da voz firme o monstro gaguejava,

A calda as pernas trancafiava,

E do pescoço apenas uma estralada.

Ele é bicho que busca vingança a todo teu destino codificado,

Roubaram ele dele mesmo por se ver inacabado,

Estava irado,

Mas consertado.

O Pássaro-Sol é completo e possui autonomia,

A maior constelação em astronomia,

Já encontrava paz em sua dicotomia,

A interna sintonia,

E sorria.

Tal pássaro nasceu sem ninguém ao seu lado,

E isso não o deixava conturbado,

Sabia que não tinha chão em todo seu universo,

Teu refúgio era seu próprio verso,

Sem inverso,

É completamente convexo,

Mas de emoção profunda,

Nada de existência moribunda.

Ele sempre voou sozinho nos céus que lhe planejavam,

Sempre lutou as lutas sozinho que o forjaram,

Sempre curou suas feridas que lhe sangravam,

Toda vez alcançou os sorriso de quem lhe amavam,

E os que amaram,

Perderam tudo aquilo que ele é e sempre será,

Alguém que tem algo que ninguém terá,

Ele mesmo que eternamente se amará,

Alguma hora essa farsa viria a acabar,

O Pássaro-Sol só precisava se amar.

Amou,

Se doou,

A dor,

Se acabou.

Corvo Cerúleo
Enviado por Corvo Cerúleo em 07/03/2019
Reeditado em 07/03/2019
Código do texto: T6591488
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2019. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.