Canções do Amor. Canto 3.
CANTO 3.
Entrego-me à este amor,
Que ocultamente me deseja,
Esta, que é, tão bela flor,
Que à tanto almeja,
Que intensifica-me a dor,
Sendo assim… Que seja,
Deliciamos em nosso segredo,
Nos entreguemos sem medo.
Entrego-me ao desespero de te amar,
Sem medo ou razão,
No entanto, a alma quer se calar,
Mas no peito bate forte o coração,
Que ao meu sentir foi anelar,
Caminho errante e sem direção,
Então ela surge de repente,
Surge, o anjo ledo, tão indiferente.
Entrego-me a esta cruciante dor,
No âmago renovando,
Ao teu toque, ao teu calor,
Na minha carne mutilando,
E no sentir deste ardor,
Sigo em silêncio chorando,
Cante o amor… Poeta errante,
Cante o amor… Vil e delirante.
Entrego-me sem nada saber,
Me derramo por inteiro,
E mesmo sem te conhecer,
Sou o teu cancioneiro,
No decurso deste poético viver,
Meu verso se faz prisioneiro,
Amor que a tudo transforma,
Amor que a todos deforma.
Entrego-me como ave ao seu canto,
Aqueles dias, são sempre a mesma tarde,
Naquele encontro; e sempre o mesmo encanto,
Da minha vida… A não dita verdade,
De quem dizem ser o santo,
Mas que nunca sentiu tal santidade,
Sou folha seca ao chão,
Voando sem direção.
Entrego-me a dor das recordações,
E ao desespero de querer,
Em inúmeras deliberações,
Em nenhuma soube o que dizer,
Em todas essas orquestrações,
O coração enganou-se no que fazer,
Por isso, é o amor um gosto de fel,
Por isso, é o amor carrasco e cruel.
Entrego-me a dor,
Ao extremo sofrimento,
Ao extremo do amor,
Ao descontentamento,
Ao meu próprio rancor,
Ao êxtase desse sentimento,
Sem destino certo,
Perdido neste deserto.
Entrego-me como na vez primeira,
Como à flor entrega-se à abelha,
No último acorde da canção derradeira,
Na última e incandescente centelha,
Sentado na mesma e velha cadeira,
Te observo; teus olhos, a face vermelha,
Cabelos soltos derramando-se no ombro,
O lume da pele, o perfume, bem me lembro.
Entrego-me por inteiro,
E no cárcere deste peito,
Grita este vil prisioneiro,
E não há quem cale tal sujeito,
Pobre e triste cancioneiro,
Poeta insano, poeta imperfeito,
Eu ainda te amo loucamente,
E te desejo ardentemente.
Entrego-me ao anjo ledo,
Que outrora fugitiva,
No casulo do próprio medo,
Tão divina e tão altiva,
Guardiã do meu segredo,
Mas nessa busca tão cansativa,
Despedacei-me em lágrimas e dor,
A sofrer a cada dia sem ter valor.