A mesma tarde
Andamos pela tarde até escurecer
Ela perguntou meu nome só depois
Quando não havia mais tempo
Para certas formalidades
Você me ama?
Ela perguntou depois de um longo beijo
Não sei, mas morreria por você
Se fosse preciso
Alguns meses mais tarde
Meditando nessas palavras
Percebi que era mentira
Não morreria por ela
Nem mesmo sacrificaria qualquer comodidade
Mas naquele instante eu dizia a verdade
Embora instruído, ou forçado, por seus olhos
E uma água que corria
Por uns versos que escrevera (quem?)
Suas mãos seguraram firmes
Em algum lugar do meu corpo
Mas foi em minh'alma que senti suas garras
Cravadas ferozmente
Quantas mentiras podem haver
Numa declaração de amor?
E quanto amor pode existir
Numa lágrima que nunca cai?
Enquanto ela falava me olhava nos olhos
Um truque perverso para esconder o desamor
O dissabor de uma vida clandestina
Longe de mim
Ela pertencia a outro
E ele ganhou definitivamente aquela guerra sólida
Por seus lábios e corpo
E alma e tudo
Eu te amo de um jeito estranho, ela disse
Quero provar o gosto da vida, ela disse
Quero voar alto, ela disse
Mas nada disso era verdade
Tudo o que ela tinha já não tinha mais
Ela tirou a roupa, mas não para mim
Nem naquela tarde
Ou em tarde alguma para mim
Ela apenas me beijou ao escurecer
E depois saiu correndo para os braços de outro
Alguém que olha tão profundamente
Para olhos que nunca foram azuis ou verdes
Mas da cor da própria alma
Deveria estar mais preparado para uma possível perda
Qual seu nome? Lhe perguntei tantas vezes
Meu nome começa com a mesma letra
De estrela
Mas não sei brilhar, ela disse
Estou apagando em sua voz
Estou morrendo em seus braços
E renascendo em algum lugar
Longe daqui
Deixe-me ir agora, eu imploro
Abra os braços e deixe-me ir, eu imploro
Então abri minhas mãos e deixei que ela voasse
Mas ela não voou alto o suficiente
Ela nem mesmo sentiu o gosto da vida
Ou da liberdade que pretendia
Ela continua presa
Entre dentes afiados e agonias do dia
Ainda estou vivendo a mesma tarde
E sei o quanto isso é inútil