S. Valentim

Escrito no dia 14 de fevereiro de 2016, Dia de S. Valentim.

Para Mariana Amorim.

Canta o mundo o mistério

Do cortês amor romântico

Por entre flores, chocolates

E cartões de S. Valentim.

Rosas, como teus lábios,

E violetas, quais as veias,

Preenchem bilhetes vulgares

Das crianças no Jardim.

-Não consigo crer no amor assim!

Disse eu. –Feito em massa,

Tudo quer e nada sofre.

Hollywoodiano,

Que antes da morte tem fim.

Talvez isto me faça

Desacreditar. Afinal,

Che cos’è l’amore?

Então a voz do mestre

Que clama nas praças

E ruas me chama

E diz:

-O Amor não é passível

De análise ou escrutínio;

Muito difere do conceito

Ao sábio compreensível

Não:

O Amor é o dogma

No nume da divindade

Escondido

Que se revela ao que se aproxima

Não para conhecer, mas ser conhecido.

O Amor é Deus

(Buscai e achá-lo-ei)

Para sabê-lo é preciso

Acreditar.

O Amor tudo crê.

-Como crerei eu

No que não sei?

Como saberei

Se incapaz de provar,

Ver e experimentar,

Quando ninguém há

Que me apresente?

-Vinde, caminhemos

E te mostrarei os mistérios

Do amar.

Tão contrário a si, o Amor

É a escuridão pela qual tudo se vê.

[Não tente vê-lo, Psiquê, ou você

Nunca mais o irá ver!]

No santo breu do leito

Matrimonial, melhor se vê

Não com a mente e olhar, mas com

O Ser

A si no Outro.

No Outro ele está:

No risco do desconhecido

No abismo da alma

Do próximo a quem se quer

Tomar para si.

No Outro está o eu.

E no conhecer dele, o autoconhecimento;

E na melhora dele, a santificação

Da alma, que no matrimônio é una.

Uma só carne.

Então disse eu:

Como encontro, mestre,

No Outro a mim?

Qual caminho seguir para

No desamor,

No não-eu não cair?

-O que salvar-se quer, perder-se-á:

O próximo não é meio

Que se use para encontrar

Afeto e auto-realização.

No amor, o Outro é o fim;

Os últimos, os primeiros;

E o objeto de afeto se torna

Mais importante que a si.

Negativa é a Via:

A negação da posse

Do eu, do Outro;

O conquistado é conquistador,

Que na entrega de si ganha

O mundo.

Perdendo a vida, achá-la-á.

“Agapas me?”

-Philo se.

Ensina-nos a amar como a Ti.

Disse então a minh’alma:

-Sê valente! Assim como foi

O pequeno mártir antes de mim.

Saí, no retorno ao lar que nunca vi

Após a longa e triste guerra

A circunavegar o globo

Em busca de alguém com quem

A alma seja digna de repartir.

Não vi.

Então berrei ao mar.

-Senhor, já não suporto

Estar só em mim.

Peço-te misericórdia, de um modo

Ou outro, livra-me de

Afundei. E na solidão

Das águas vi surgir

Na fronte das ondas alvas

Ela.

De beleza afrodisíaca,

Mente de Atena

E alma mariana.

Pura, imaculada,

Feita por Deus pra mim.

Me encontrei

Pois me entreguei.

Rogai por nós, Senhor,

Agora e para sempre

Permita-me ser seu amado

Valentim.

M Carvalho
Enviado por M Carvalho em 20/08/2018
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