Sinfonia
Sinfonia
A gente tentava um uníssono
mas ....
semitonávamos...
Os desencontros nas canções
cantadas assim à revelia
de forma improvisada e pueril
nos faziam cúmplices
crianças felizes
querendo burlar a seriedade da vida
pelo menos por alguns momentos
quando a leveza era permitida
e nada nos desviava o pensamento
E misturávamos os ritmos
o nosso gosto tão eclético
buscava os boleros bem marcados e românticos
com cheiro de rosto colado
beijo roubado
olhares mergulhados um no outro
ou então era uma salsa cubana
de Celia Cruz que a gente tentava acompanhar
sem nenhum domínio mas muita pretensão...
Ah como éramos pretensiosos!
Ele bem mais do que eu certamente
Às vezes os semitons
vinham em inglês
fluente pra ele
e desconsertante para mim...
Ora em italiano
ou espanhol...
Mas era nas canções do Chico
que a gente se redimia
até acertava os tons
e as emoções também...
"se acaso me quiseres
sou dessas mulheres
que só dizem SIM!"
era um bom começo para que
a ternura nossa
às vezes interrompida
ou desvirtuada em algumas rusgas
voltasse plena
junto com nosso riso
tão bom
tão belo.
Confesso que sinto uma falta imensa
de cada semitonada
de cada momento em que
a gente podia ser mais ou menos
uma exacerbação aqui
outra acolá
uma carícia mais sutil
ou um meio sorriso
um olhar que não virou a esquina
atrás de uma utopia
num dado momento todos os semitons
se acertavam de forma tão linda e sedutora
que a gente fazia um concerto e tanto
capaz de evitar para sempre o pranto
que nasce nos corações baldios de amor
e que nunca se atreveram a sair do ritmo
por apego à perfeição
por medo do ridículo
Que pobres são os amantes que não rompem o siso
não se entregam ao desvario
não se lambuzam de carícias
como quem saboreia caquis maduros
O amor
de tons e semitons
de encontros e desencontros
não é bem comportado.
Todo amor carece de desacertos
Ah,mas quando as arestas desaparecem...
Como é mágico!
Amarilia T Couto