Chuva
Pela vidraça, ao vento, a chuva me olha.
Me chama pra dança, brada, e eu finjo não ver.
Esguia e sorrateira, pendura-se nos fios,
escorre nas paredes, nos vidros, e me olha,
e jura com ar inocente que não molha.
Encantado, não a perco de vista.
Rio quando põe outro a correr
Parece brincar de “pega-pega”,
parece que ninguém a pega.
E ela insiste em me olhar.
Escondo-me atrás da cortina.
Sorrio a enganá-la.
Esqueço, porém, que o vento a admira e lhe é fiel.
E num embalo sem igual jogam-se à vidraça assustando-me.
Meu coração bate mais forte e eu sei que ela sorri.
Envolvido pela emoção, calço a galocha.
Cubro-me e abro a porta.
Com passo de valsa adentro o grande salão.
É pura magia - joga-me para lá, para cá e até no chão.
Me cobre por inteiro, molha minh’alma.
E nada diz, só me vê feliz.
Nem capa nem galocha nos separam.
E ela sorri
porque me olha.
Porque assim quis
e porque me molha.