Nus
Chegas como uma parte de mim.
Vem contigo a aragem, o fumo, a água da nascente
e todo o teu corpo diz de saudades, vontades, inclemências.
Beijas-me e a minha é agora a tua boca
e falo nela salivas, fogueiras, vidas, canseiras.
Há uma guerra surda sob a pele e já nos reconhecemos,
delicadezas, dores finas, o agudo gume das unhas.
Vem, dá-me de ti riso e corpo,
montanha, furnas, relva doce a arrumar o caminho das luzes.
Quero ir na onda gigante, quero cair da tua boca hiante,
quero ver em ti o meu sangue a avermelhar de fúria
todas as palavras que já não entendo, não ouço.
São de moer e mastigar, de bater.
E a pele grita devassidão e goza mansa a morte que chega
se já perdidos somos mármore ainda quente,
jacente, evocação do tempo em que vestidos nos sabemos nus.