RETIRANTE

Queria ir-me embora para América,

Que ouvi tantas vezes falar.

Terra de astros e estrelas.

Sairei de casa pela manhã,

Ainda no alvorecer

Da minha rua sem paz,

Com portas e janelas fechadas

Ninguém poderá me ver

Acordadas, verei só duas mulheres e um homem,

Tranqüilos me acenando lentamente.

Creio que meu corpo sozinho,

Irá me acompanhar.

Meu espírito deverá estar vagando

Entre os amigos no Rio.

Ninguém eu deixarei em lágrimas

Mamãe foi morar com Deus.

E a mulher que outrora era minha esposa,

Agora é apenas mãe de meus dois filhos.

Partirei-me sozinho,

Levando no peito saudade.

Mas feliz com a própria vida

Que para mim não pedi, cheia de dor

Mas não arruinei para viver.

Verei amontoado de cidades

Ficando para trás

E na frente se abrirem campos verdejantes,

Com flores e vaga-lumes.

Como ilusão de grandeza

Que cintilam no plano superior.

Num alvo qualquer do dia,

Uma brisa me invadirá.

Sentirei o clamor morno

Do sol que vem do oceano.

Chegar-me-ão vozes infelizes,

Como a desejar me amargurar

Mas não virá mais a memória,

Para mim nada será surpresa.

Atravessarei luzente e plácido

Tolerante e subjetivo

Como uma folha morta num regato,

E quando, de um certo espaço

Vier-me a solicitação vaga,

Mas nem até logo lhe direi.

No abastado império americano,

Morrendo de saudade entrarei.

R J Cardoso
Enviado por R J Cardoso em 23/10/2005
Reeditado em 25/10/2005
Código do texto: T62557
Classificação de conteúdo: seguro