Sete Mortes
Eu morri sete mortes por você
Há tantas décadas que nem consigo mais contar
Num tempo em que ainda era ingênua o suficiente para acreditar
Que as coisas podiam ser simples e que nós dois podíamos durar
A imortalidade deixou todos insensíveis
Acomodados em seu mundo perfeito
Determinados a manter sua procrastinação e falta de realizações eternas
Enquanto fingem que não existem as tragédias que acontecem além de onde seus olhos podem ver
Meu amor, somos os únicos cercados de morte em um mundo de utopia
Fadados a ceifar vidas aleatórias
Para poupar um planeta que não foi criado para comportar uma humanidade eterna
Meu amor, como foi que encontramos um sentimento tão profundo compartilhando uma tarefa tão terrível?
Como podemos falar em amor se ele é proibido para aqueles que trazem a morte?
E já faz tanto tempo desde a última vez que teus dedos tocaram minha pele áspera
Tantos anos desde que tuas mãos me despiram de meu manto púrpura sempre ensanguentado
Incontáveis noites escuras desde que teus beijos me consolaram de nossas tragédias diárias
Mais décadas do que pensei suportar desde que revivi pela última vez
Apenas para ser condenada a uma vida sem poder te amar
Mas, às vezes, quando o vento sopra em minha cabana à beira do riacho
Ainda fecho meus olhos vermelhos e vejo teu manto marfim farfalhando ao sabor dele
E te juro que ainda me traz a mesma paz que eu sentia naqueles tempos
Mesmo que hoje não passe de um instante de ilusão
A vida foi dura demais para que eu ainda consiga chorar
Mas quando te vejo ao longe sendo a mesma pessoa admirável que me conduziu a esse mundo de contradições
E te cumprimento polidamente como o colega e amigo que sempre serás
Tenho saudade do que fomos
E guardo dentro de mim toda a vontade de começar tudo de novo
Mesmo que para isso tenha que morrer mais sete mortes
Porque trazer a morte é nossa missão
E mesmo que todo dia eu lute para manter minha humanidade
O futuro que existe para nós não deixa espaço para amor
(Ainda que eu continue morrendo por ti a cada noite solitária...)
Inspirado no livro "O Ceifador", de Neal Shusterman