SEMIDEUS

Todos os dias em frente à minha casa ele passa.

Em seus lábios o doce sorriso de menino carente

E debaixo do braço carrega os livros e se sente

Como se fosse o dono da rua e da beleza esparsa.

Longos e lisos cabelos loiros esvoaçam ao vento

Enfeitando de formosura sua face meiga e branca,

Sua pele brilha diante de um sol que é esperança

Dos dias lineares que vão prestar contas ao tempo.

Em seus olhos azuis há um firmamento de estrelas

Que lhes dá a certeza de que o mundo é multicor

E feliz ele perambula e pulula com entender a dor

Que se estampa em muitos lares de sutis alamedas.

Vaivém diário o leva de ida e de volta aos estudos,

Contudo sua perene alegria enche o espaço de luz,

Pois é um garoto lírico pleno do bálsamo que seduz

Todos os olhares que observam o bailado de veludo.

Trágico deserto é o dia em que se percebe a ausência

Do tesouro que conquista pé ante pé gentes diversas…

O final de semana é de uma angústia intensa e imersa

No silêncio que atrofia a calma sem a jurisprudência.

Ah! Quando chegam as férias, inconcebível o horror

Que se instala nos íntimos que são seguranças da rua,

Ninguém fala ou espirra, tosse alguma tece ou atenua

A tristeza do ícone que locupletou o ambiente de amor.

Retorno às aulas… Lá vem ele e de volta os sorrisos…

É um ídolo natural que se impôs devido à sua fofura,

Lindo como nenhum outro que por ali transita e cura

Qualquer enfermidade que tencione despejar seu siso.

Certa manhã tudo ocorreu diferente… Ouviu-se a voz.

Grande foi o espanto que adentrou nos âmagos e se fez

Do alarido que ziguezagueou no ar um devaneio talvez

De ter entre os moradores o ser dono de todos os sóis…

De fato aconteceu… A formosura trouxe o que é talento

Para residir dentre admiradores que eram total tietagem.

Em todas as casas houve de se transformar a paisagem,

Porque a pura beleza tornou-se monarca, embevecimento.

O tempo consignou essa história… Todos viviam em paz,

Acabaram com o orgulho e o egoísmo, tudo reino do bem.

Ele era o motivo da aliança e tudo era de todos e ninguém

Era mais que outro… Tudo se compartilhava, eram iguais.

Aquela beleza me fascinava… Algo estranho era aquela tez.

Alguns anos mais tarde. O menino tornou-se um belo rapaz

E, num dia de festa em plena praça, diante de todos os sais,

Despiu-se. Mostrou o lindo corpo, abriu as asas e se desfez!

De Ivan de Oliveira Melo

Ivan Melo
Enviado por Ivan Melo em 06/09/2016
Código do texto: T5751756
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