Retalhos
Eu não sou sombra
Nem tampouco claridade
Treva que dentro de mim assombra
Escurece-me em inverno, diuturnidade.
De certo vida não haveria
Num mar feito de gotas de mim
Águas sem ondas, rala baía
Mar agitado, tormentas sem fim
Deixei-me ser tela da vida
Recebi dela traços profundos
Tais pinceladas cravaram feridas
Dividiram-me em dois, implodiram meus mundos.
Sou preso em algemas ferrenhas
Cativo e açoitado por meus anseios
E meus desejos combustam tal qual a lenha
Na incessante fogueira de meus devaneios.
Dentro de mim já não me encontro
Fora de mim não percebo ninguém
Meus olhos atados, traídos e tontos
Me mostram o que querem, me fazem refém.
Afinal de todas as contas
Não sou verbo, não sou canto, nem sou prosa
Semeio a verdade que a ti desaponta
E renasce mentira, então, fabulosa.