INVERNO
Desculpa-me se te pareço demasiado fria
Não ser abrigo nas noites não quentes
E com palavras ásperas conduzir o ritmo
E com letras vulgares desfazer o entendido
E nunca entender-te o entendimento.
Desculpa-me se de arrojo me falta a cadência
E se de delicadeza desfaz meu olho sério
A pureza não me pertence, uma vez vestida
A nudez do meu pressentimento é vício de fim
Pertencer ao passado e nunca ao presente...
Porque do futuro medrosa, escondo-me entre a fronha e o lençol.
Pensa-me calúnias, injúrias sem fim
Para lembrar-me, perpetuamente, que o amor não é para mim.
Assemelho-te a um ofídio, a um tigre, a um leão...
Não.
Ao avesso, quedo chuva, passo a andorinha e torno-me pó.
Lembra-te da plumagem do Aterro?
Ventanias esfolheiam os cabelos
Desculpa se não entendi – eu nunca entendo
O laranja da folhagem diz que chegaria o inverno.
Chegou.
Murmúrios de uma noite regada a vinho
(você não vinha)
Bradaria para todos seu (e)terno amor
Todavia, sussurrou-o ao meu ouvido
Para que a honra de me amar
Selasse meu castigo: alvedrio.
Querer me honrar, logo a mim,
Tão besta, tão parca...
Remissão desonrada.
Viste em mim um peixe?
Uma carne no pasto?
Pois que encontrou um bicho frágil.
Agora aguenta, porquanto hiberno:
Sono pesado, tranquilo, aquietado...
Em seus braços acolhida,
Preenchida:
Pedaço por pedaço.
Morre de amores, desde que distantes.
Agora aguenta,
Que dessa vez eu não fujo:
Amo-te mais que dantes.