ABACATES COM OLHOS

Ela me chamou à janela.

“Veja! Aquelas maritacas ali na árvore!”

Cheguei perto e realmente,

vi um par de maritacas.

Um casal indefeso.

Meu Deus e tão indefesos nós dois éramos

que eu quis dizer:

“Sinto agora por você

o maior amor que posso sentir.

Tanto amor e tenho medo.

Medo por seu rosto adolescente,

por seus pequenos seios

e medo por minha fragilidade,

a mesma daquelas aves,

dos galhos onde pousaram

e até desta janela antiga

com a tinta recente

a recobrir a madeira velha.

Minha asa está quebrada. É isso”.

Mas não disse nada

e o casal de maritacas pingou para outra árvore.

Ela segurou o meu braço.

( entendia todos os pássaros)

e soltou:

“São apenas abacates com olhos”.

E eu pisquei,

avoado.

Do livro: "Borboletas noturnas não existem"