Aprendendo a amar

Aprendendo a amar

Não, eu não sei como ficar

Se parte da janela é lembrança

Hoje não quero vento pra brincar

Deixei nas vidraças a criança

É que tudo aqui lembra ironia

Das colchas, os meros retalhos

De você, a mais torpe alegria

Em meus olhos, os frangalhos

De uma noite, de uma vida maldormida

Nunca fui de fazer moradia

Não lembro de quando chamei de lar

Sei que tudo que me resta é hamartía

Memórias que não pretendo voltar

E como pude rapidamente me entregar

Sabendo que coração nunca tem lugar

Em terra de preto e branco fui vermelho

Expandi o que aqui dentro nunca soube ficar

Em teus olhos vi tanta poesia

Teu cenho semicerrado era pura

Monotonia que eu ousava em desconcertar

Portas que tentei arrombar, chamar de lar

É que existem em mim tantos cacos

Mora em mim um ego maltrapilho

Um bêbado sem juízo, um fraco

Alguém que se deixou levar, a esmo

Sem tempo, sem lenço, sem medo

Quis do amor tanto abrigo, tanto ninho

Fiz de mim o mais frio mendigo

Esperei do amor a mais forte fogueira

Hoje, sem eira nem beira, decidi desistir

Não é que aqui não pulse

Nem que o orgulho fale mais alto

É que coração não precisa ser mudo

Muito menos ritmado

Mas para ter samba é preciso choro de cavaco

Relinchos de cuíca e ginga de um mulato

Perdoa essa saída tresloucada

Esquece meus sorrisos amarelados

Esqueci de limpar a mesa, olha o café

Lavei os pratos, limpei a louça, tomei a cerveja

E se um dia eu for bem vindo

Aviso que chegarei mansinho num domingo

Que é quando no zoológico um menino

Segura um balão vermelho, chora no espelho

Não sabe se é coração, domingo ou menino

Ponha a mais bela roupa que tiver

Ou mesmo um vestido qualquer

Pouco importa a tua beleza

Quando o que o que se tem na mesa

Não passa do amargo do café

Eu, de alma lavada, sou mesa farta,

Espinha ereta, coração alerta

Pois menino que sai de casa

Deve mesmo ir para a escola da vida

Gabriel Amorim 23/04/16