À MULHER QUE NUNCA EXISTIU

( Invento coisas que não vivi,

talvez por viver o que não inventei.

Por que a vida é tão complicada?...)

Eu te encontrarei um dia, por acaso

e simpatizarei contigo, digo, e por que não?

Juntos lembraremos casos sobre casos

e nos alegraremos pelas ilusões.

Atravessaremos praças da cidade

e conversaremos sobre coisas vãs:

Deus, filosofia, vida, liberdade

nos encantaremos, lá se foi manhã.

(As horas voam se estamos felizes.

Por que é o tempo inclemente?

Onde se esconde o amor?)

Alimentaremos nossa fome ávida

de conhecimentos um do outro, e assim

nem perceberemos que a tarde cálida

em meio a brisa árida chegaria ao fim.

Entraremos noite, juntos, de mãos dadas

festa enluarada, copos de papel

e nos desejaremos, alta madrugada

vinho, voz, baladas, nessa estrada ao léu.

(O amor é mais forte

quando se sabe que não haverá amanhã.

Por que o pensamento é tão cruel?)

Então, vislumbrarei teu corpo

inebriado, louco, meu desejo quer.

Minha barba rala dirá que sou um homem

tua coxa esguia dirá que és mulher.

E eu me deitarei em teus lençóis de seda

ouvindo no teu peito o palpitar da alma.

Assim, te despirei do penhoar de renda

e te penetrarei em serenante calma.

(Os gemidos silenciosos dos nossos corpos

fazendo-se um só, e por fim,

o meu amor a te inundar.

...Seria esse o sentido da vida?...)

Nos despediremos na promessa incerta

de nos encontrarmos em um outro dia.

Mas será que o tempo, essa porta aberta,

conservará intacta a nossa magia?

Até logo, adeus amor inexistente

não foste certamente quem tanto eu quisera

novamente adeus, meu grande amor ausente

tristemente adeus, meu grande amor quimera...

Epitáfio:

(Despedidas são sempre tristes,

principalmente se são imaginárias.

Se é loucura, o que restou então?

O amor que se viveu... Ou não.)