O Teu Fevereiro
I
Há a vontade da expressão
de tuas mãos em faca
da garça pluma que se arrisca
no mar arcaico onde se onda
e se pisa
e se farta a vista
no blue turvo de nossas falas
Há a farteza das palavras
lassas em madrugadas brunas
- Há o laço feito pelo falo
que se deita, orgasmo
no melaço de tuas coxas
Há a expressão grave
entrevista em meia luz,
há a cruz e a meia espada
E estes teus olhos
e estes teus olhos
e a tua voz sem fados
e às vezes tarda
E a tua voz
que bem cedo me aguarda
e o teu cego e escuro canto
onde me escondo:
- Ser sem ser, breve e em pranto!
II
Há uma tua sala
nestes fevereiros
onde não houve o meu nome
nem a minha voz falando
onde não me ouvias
por mais que tracemos
falsas datas em retratos
reverberados
mas, para mim, mudos e sem história
Reverberam, isto sim!
No meu regaço os teus espelhos
deste agora-ave falando
enquanto voa, ave-faca rasgando
o pano azul de teu céu
de nossos céus, panos que se encontram
nestas camas vazias
de teu corpo que já foi
III
Ai, querida, que te quero
te quero manso, mano
nestas tardes em que não sou teu
por ser do mundo
por ser fera te olhando!
Mas te quero, te quero sim
com o manso amor dos encontrados
dos refeitos, dos banhados
nestas águas em que me chamas
mas não vou, não posso ir
IV
Ai, que te quero
quando te encontro
nesta balança de morte e vida
em que nós somos, tardos às vezes
mas prontos
na inteireza de nossas falas
e na aspereza de nossas camas
Se és a musa finda em que me escondo?
- Não sei. Não te respondo
V
Sei que me fala a vida quando te olho
e me encontro.
Sei que me falta a fala
em nossos beijos de fome
na valia tarda em que me cresço
falo e fardo te esperando
VI
Mas
ser sem ser, no tango das noites
dos desencontros, dos desesperados
não me posso ainda, não me sou ousado
E se te firo e te machuco
longo e largo
às vezes, em faca de eunuco
que fazer?
Se sou falo e fardo te alargando
meu amor, eu, no entanto
Eu sou vida te tomando!