Tempos modernos
 
 
Os tempos mudam, e nós mudamos o tempo,
Antes, eu lhes digo, tudo era muito diferente,
A cidade era grande, já havia muita gente,
E não tinham tantos barracos nas favelas.
Havia muito mais casas com janelas,
De onde podiam-se ver árvores nos quintais;
Ainda bem me lembro, das roupas nos varais.
Os tempos modernos trouxeram comodidade,
Tudo é muito mais fácil, agora, na cidade,
Máquinas de lavar roupas e geladeiras,
E a água tratada, jorrando nas torneiras.
Ganhamos muito conforto, em verdade,
Mas com certeza, perdemos em humanidade.
Vamos falar com franqueza do humanismo,
Mas sem nos contaminarmos pelo cinismo;
Antes havia uma rede de proteção social,
Que era cultivada de uma forma natural,
Os vizinhos se conheciam e se ajudavam,
Havia os que também se engalfinhavam.
Parado na porta de um edifício, um rabecão,
Carregava um morador em um caixão,
E fui perguntar ao porteiro, quem era,
E ele me respondeu com naturalidade,
Tratar-se de um presunto, já de idade,
Um peso morto para a sociedade...
A morte já não é sentida, foi banalizada,
O motociclista, na rua, estraçalhado,
Não é uma pessoa que foi acidentada,
É xingado, pelo trânsito engarrafado.
E os moradores de rua, os dementes,
Que sob as marquises são residentes,
Ou os menores que são delinquentes?
Passamos sem os ver, são invisíveis,
Alegamos não ser nosso problema,
São causas da ineficiência do sistema,
E falta do funcionamento do Estado,
Assim, está perdoado o nosso pecado...