Amor Rasurado

Nas passagens do tempo,

do antigo ao presente,

tu que mal era gente,

e nem sabia o que era,

o que havia entre a gente.

Do presente ao futuro,

sentimento tão fútil,

sabe lá como sente,

sabe lá se é quente,

faz falar como gente

apaixonada, dominada,

amada, quase retardada

pr'um amor bem carente.

Passa, passa, tudo passa

o frio passou, o vento levou;

a tempestade iniciou,

mas algum deus encerrou;

por mim, por você e por tudo.

Tudo é que é e que há de ser,

tudo que amamos, tudo que amou,

bem no meio vazio

aqui nesse coração fútil,

a flor que aqui plantaste

de uma vez desabrochou.

Lembras sempre do amor,

do sangue que corre;

Tu lembras dos cortes,

dos beijos e momentos,

momentos que não morrem,

lembranças eternas,

acompanham os passos

tristes, distantes, vazios...

Do instinto do fácil,

desejos, paixões,

do sozinho, imutável.

Quem diria você,

sensível e amável,

como era teu coração,

que chorava no escuro,

é tanta emoção,

e sozinho, ligava

na noite escolheu

morrer aqui e caminhar

na triste solidão...

Estive, mas não estou,

nem sei se estarei;

Quando sentires só,

ainda que acompanhado

deixe o Sol tocar-lhe a face,

verá um rosto deformado,

só um coração magoado,

de dor chora numa caixa,

apertado e sofrendo

por um amor por ti deixado,

um fracassado e estragado...

Que amor foi esse?

- Um amor rasurado.

Quem vem lá, que te acompanhas?

Não há verdades, histórias, passado,

nem há sinceridade, só a sua façanha.

O que te prende, te rouba, te engana,

te engana, te gosta, com ti anda, a ti ama,

não cospe, não bate, não arranha;

Como amas, Deus? Como ama?

Se pra amarmos levamos tanto tempo,

no frio, sabemos,

rosas morrem nos primeiros momentos.

Não falo, não creio, não ligo,

não abro, nem fecho, não fico,

não gosto, não vejo, não minto,

que amo, é fato, não mito.

Mas morre, mas passa, esfria,

pra sempre sempre acaba,

no céu, no inferno, infinito,

promessas, juras, mentiras!

Vão embora, vão embora...

Amados, amarrados, sofridos,

apaixonado, encantado, traído,

enganado, afastado, trocado, amado...

E o que sobra de nós

é apenas isto?

Foi cumprido mas,

que amor rasurado...

O que sobra? O que sou? O que és?

se não um poeta da morte há dois pés?

O que sobra? O que sou? O que és?

és um garoto que não sabe o que quer.

Tempo passa, tempo acaba, e é infinito

e tudo muda, tudo volta, tudo é lindo,

o que morre na terra, nasce outra vez,

mas o que morre aqui dentro, no peito,

jamais some, jamais apodrece ou vive outra vez.

Olhe a estrada, pra frente e pra trás,

veja, o que por você foi deixado?

Vamos! demorou e já está tarde,

deixou sozinho algo com sangue conquistado.

Não sou eu, não somos nós, nem nada,

não é real, nem o contrário,

nem feio, bonito, ou desejado,

não é certo, não é errado,

não é nada além de verdadeiro,

nem nada além de estragado,

deixado, atacado, parado,

e morto, e sozinho, e acabado,

nada mais, nada menos,

que um amor antigo cultivado,

raro, primeiro amor do passado,

mas pra sempre abandonado;

que amor rasurado.