MALAS DESFEITAS

Longa foi a viagem. Quantas malas nessa imensa bagagem e conheço-as uma a uma. Aos poucos me desfaço das malas e retiro peça a peça o que sobrou de tantas vidas vividas, que ali estavam guardadas, carinhosamente, como se eu não quisesse me desfazer dessas malas.

Eu trouxe dessa viagem muito mais do que eu levei passando pela alfândega do tempo.

A juventude me mostrou, de uma maneira muito pura, que a velhice jamais poderá ser um fardo.

Retirei de algumas malas, já desfeitas, o poder da dignidade, o perdão não compreendido e a compreensão dos poucos que não têm tempo para uma breve reflexão.

Viagens longas, infindas, movem a vida como se nela não coubesse a limpidez que nos faz tão importante em noites e dias, e que ainda nos cabe.

Cá estou. Desfazendo a bagagem, feito aquela criança que teima em brincar, brincando sempre com a surpresa.

De algumas malas retirei sabedoria; de outras, eu deixei guardadas lá no fundo, bem no fundo, as lembranças que não faço questão de revivê-las.

De alguma maneira, em algum dia, eu me tornei mestre e assim continuo sendo um discípulo da existência que sopra aos meus ouvidos que o tempo nunca foi um espaço vago.

Uma vez, malas desfeitas, os meus pés estão no chão e a vida me contempla. E vou cuidar de fazer uma mochila e me aventurar por aí.

Fernando Varela
Enviado por Fernando Varela em 22/08/2015
Reeditado em 26/08/2015
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