Deus e o poeta
Um dia, olhando o céu, contando estrelas, lembrei-me de ti,
Distante, e senti saudades; senti em meu peito uma dor tão forte,
Tão grande, assim como, lembro-me ainda, quando te perdi,
assim como se, por fim, me chegasse a almejada morte.
E, desesperado, em minha dor, senti que perdia a razão,
E chorei. Chorei um choro de amor perdido, copioso, constrito,
Com lágrimas fluidas correndo pela face, toldando-me a visão,
Com as mãos postadas para Deus, orando, pedinte, aflito.
Dando asas ao turbilhão de minha mente, em pensamento,
Lancei-me em direção ao infinito, rumo às estrelas, rumo ao céu
Liberto de meu corpo, de mim mesmo, levado pelo vento,
Vaguei pelo éter, além dos astros, das galáxias, do universo, ao léu.
Voei além do princípio e do fim, além da própria eternidade
E vi Deus, fui até Ele e Lhe falei em todo seu esplendor:
- Oh, Deus, Vós que sois amor, com toda e a maior humildade,
Deixa-me ser o Sol, faça-me Sol, permita-me irradiar seu calor.
Deus sorriu e, sorrindo, me fez sol; e eu fui o sol a brilhar
Solene, estrela centro do sistema, iluminando a Terra,
Feliz a cada momento em que nascia, em que te podia mirar
Durante todo o dia, até me esconder por entre as serras.
E eu brilhei, toquei teu corpo, não como quis, mas como podia
Dourei tua pele, corei teu rosto, te vi pela janela, entre frestas,
E eu te amei e tu me amaste, na mais perfeita sintonia,
Tornando cada um dos meus dias, em dia de infinda festa.
Porém, quando a Terra girava, vinha a noite e eu te perdia
E ao te perder, por não mais te ver, chorava triste, desolado,
E voltei a Deus, e Lhe falei: - Senhor, em toda Sua sabedoria,
Deus, oh, Deus, não permita mais que brilhe assim apagado;
Deixa-me ser a Lua, faça-me Lua, permita-me brilhar somente
À noite. E Deus novamente sorriu e, sorrindo, me fez luas,
Me fez lua nova, lua cheia, lua minguante, lua crescente,
E eu fui lua, iluminei a noite, fui senhora da noite, somente tua.
Brilhei no céu, toquei teu corpo, não como quis, mas como pude
Resplandeci a palidez de tua face, o dourado de teus cabelos,
Velei teu sono, te amei e fui amado, ao som de suave alaúde,
Tornando cada uma de minhas noites, em eternos desvelos.
Porém, quando a terra girava, vinha o dia e novamente perdido
E ao te perder, por não mais te ver, chorava triste, desolado.
E voltei a Deus, e Lhe falei: - Senhor, atende mais este pedido:
Deixa-me ser a Terra, faça-me Terra, este planeta azulado.
E Deus me fez Terra, e eu fui a Terra, vivendo sob o sol e sob a lua,
Me enfeitei com relvas, com rios, com lagos, me perfumei com flor,
Cobri-me com mares para te agradar, fiz-me bela e somente tua.
E te agradaste, enfim; e sorri ao ver que me tocavas com amor.
E eu a todo teu amor retribuía, não como queria, mas como podia:
Tomavas de minha água e de meus frutos, banhavas em meus rios,
Pisavas a relva que me vestia, cheiravas minhas flores todos os dias
Subias em meus montes, sorrindo, em doces e infinitos delírios.
Porém, veio o homem, sentiu ciúmes, invejou-me e para ter-te,
Depredou-me, poluiu meus rios e lagos, derrubou meus montes
Murchou minhas flores, rasgou minha relva, destruiu-me o verde;
E tu não mais sorriste, me deixaste e nem mais te banhas em minhas fontes;
calçaste teus pés com sapatos, e nem mais deslizas em minha relvas,
Andas sobre asfaltos e calçadas; - eu te perdi, não mais te vi, e chorei
Desolado, procurando-te em todos os cantos, em meio às selvas,
E por não te encontrar, novamente a Deus voltei, O vi e com Ele falei:
Senhor, permita que não mais viva assim distante, dela ao redor,
Penetra-me em seu interior, faz-me dela o rubro sangue, sua vida.
E Ele me fez o sangue da mulher amada, em Seu infinito amor,
E flui, deslizei, corri e caminhei por cada parte, a mais escondida,
E te dei cor, te fiz saudável, te fiz forte, a cada dia mais linda.
E tu me sentiste e eu te toquei, não como quis, mas como podia
E tu me acolheste afinal e habitei no mais íntimo de tua beleza infinda
E te fui vital; tu me adoraste, me curtias e tinhas medo se me perdia,
Retirado do cerne de teu corpo, em teus ciclos, qual lágrima sentida.
Até que um dia, tu te agitas, tu me agitas, me faz correr lépido
Em tuas veias; como um raio, em teu coração, qual flecha incontida,
Atravesso-o, batendo mais forte, descontrolado, intrépido.
E me vejo, impotente, expulso de tuas mãos e de tua face o alvor,
Ora gélidas, suadas; e sinto teu corpo amado em tremor crescente,
Se agitar em espasmos, fremente, bailando ao ritmo do amor,
Já não mais eras razão, dominada e guiada por paixão ardente
Amavas outro que não eu, que me perco, esvaio e sofro calado.
Sorris para outro amor que não o meu, assim, sem esmero,
Te entregas a esse amor, vives esse novo amor; e, desconsolado,
Mais uma vez, torno a Deus e falo com Ele, em meu desespero:
Senhor, a meu pedido, fizeste-me Sol, imenso, infinito, forte,
Fizeste-me Lua, plácida, serena na noite. Fizeste-me também Terra,
E depois sangue da mulher amada. Nada mais me resta senão a morte
Exangue. Faz-me novamente um homem, neste ciclo que se encerra.
Permita-me, Senhor, que more no coração ardente da mulher amada,
Faça-me o homem por quem ela vibra, por quem sorri, por quem chora,
A quem acolhe em seus braços e envolve em carinhos, mãe devotada,
Amante, amiga, enamorada. Faça-me o homem a quem ela tanto adora.
Deus sorriu, solene porém zombeteiro, e disse-me: - NÃO! -, definitivo.
Dar-te-ei o mundo, dominarás o conhecimento com belas palavras,
Serás homem, mas dela nunca será teu o coração, para sempre emotivo,
Cantarás em odes, sonetos, versos, eternamente, a mulher que amavas;
Dela nunca serás o amante, e nem mesmo por breve e fugaz instante,
Vou tirá-la de tua mente; ela será a eterna namorada, sempre presente,
Em cada um dos momentos de tua vida, e para sempre seu semblante
Ficará gravado em teus pensamentos. Serás sempre louco demente,
Amando-a a cada dia, por todos os teus dias, mais e mais intensamente
Sem tê-la, sem vê-la a todo instante, como em tuas fases de Sol, de Lua,
De Terra, de sangue. Não mais a tocarás, sequer por momento somente,
Vendo em braços de outro, enlevada, a deusa mulher que um dia foi tua.
Este será teu julgo, teu perpétuo castigo, por tua loucura desmedida,
Por teres ascendido aos céus, voado pelo éter, pretendido ser astro,
Por quereres envolver, ínfimo e infinito, simultâneo, a mulher querida,
Olvidando-te de ti, em própria vida, por ela, sem rumo e sem lastro.
Mas, para aplacar este infinito e eterno martírio, este infindo sofrimento,
Terás olhos que verão a beleza das flores, dos lírios, que cantarás em prosas
Suas cores como a da pele desta mulher; terás o olfato que por momento
Sentirá seu perfume, como quando a tinhas próxima, exalado de rubras rosas.
Dar-te-ei ouvidos que ouvirão como nenhum outro o canto plangente e soturno
Dos pássaros, música celestial que te enternece como a voz da mulher amada,
E mãos sensíveis, que sentirão a maciez de seu corpo, no repouso noturno
Que nunca mais terás, em tuas noites insones, vazias, tristes, desoladas.
E sempre que a saudade se fizer presente, colhe as lágrimas de teu pranto,
E, em tua solidão, a vagar pelo mundo, sem rumo, perdido, eremita, asceta
Componha teus versos de amor; transforma tua dor em sorriso franco,
Pois assim serás, agora e por todo o sempre, simplesmente: um poeta!
Um dia, olhando o céu, contando estrelas, lembrei-me de ti,
Distante, e senti saudades; senti em meu peito uma dor tão forte,
Tão grande, assim como, lembro-me ainda, quando te perdi,
assim como se, por fim, me chegasse a almejada morte.
E, desesperado, em minha dor, senti que perdia a razão,
E chorei. Chorei um choro de amor perdido, copioso, constrito,
Com lágrimas fluidas correndo pela face, toldando-me a visão,
Com as mãos postadas para Deus, orando, pedinte, aflito.
Dando asas ao turbilhão de minha mente, em pensamento,
Lancei-me em direção ao infinito, rumo às estrelas, rumo ao céu
Liberto de meu corpo, de mim mesmo, levado pelo vento,
Vaguei pelo éter, além dos astros, das galáxias, do universo, ao léu.
Voei além do princípio e do fim, além da própria eternidade
E vi Deus, fui até Ele e Lhe falei em todo seu esplendor:
- Oh, Deus, Vós que sois amor, com toda e a maior humildade,
Deixa-me ser o Sol, faça-me Sol, permita-me irradiar seu calor.
Deus sorriu e, sorrindo, me fez sol; e eu fui o sol a brilhar
Solene, estrela centro do sistema, iluminando a Terra,
Feliz a cada momento em que nascia, em que te podia mirar
Durante todo o dia, até me esconder por entre as serras.
E eu brilhei, toquei teu corpo, não como quis, mas como podia
Dourei tua pele, corei teu rosto, te vi pela janela, entre frestas,
E eu te amei e tu me amaste, na mais perfeita sintonia,
Tornando cada um dos meus dias, em dia de infinda festa.
Porém, quando a Terra girava, vinha a noite e eu te perdia
E ao te perder, por não mais te ver, chorava triste, desolado,
E voltei a Deus, e Lhe falei: - Senhor, em toda Sua sabedoria,
Deus, oh, Deus, não permita mais que brilhe assim apagado;
Deixa-me ser a Lua, faça-me Lua, permita-me brilhar somente
À noite. E Deus novamente sorriu e, sorrindo, me fez luas,
Me fez lua nova, lua cheia, lua minguante, lua crescente,
E eu fui lua, iluminei a noite, fui senhora da noite, somente tua.
Brilhei no céu, toquei teu corpo, não como quis, mas como pude
Resplandeci a palidez de tua face, o dourado de teus cabelos,
Velei teu sono, te amei e fui amado, ao som de suave alaúde,
Tornando cada uma de minhas noites, em eternos desvelos.
Porém, quando a terra girava, vinha o dia e novamente perdido
E ao te perder, por não mais te ver, chorava triste, desolado.
E voltei a Deus, e Lhe falei: - Senhor, atende mais este pedido:
Deixa-me ser a Terra, faça-me Terra, este planeta azulado.
E Deus me fez Terra, e eu fui a Terra, vivendo sob o sol e sob a lua,
Me enfeitei com relvas, com rios, com lagos, me perfumei com flor,
Cobri-me com mares para te agradar, fiz-me bela e somente tua.
E te agradaste, enfim; e sorri ao ver que me tocavas com amor.
E eu a todo teu amor retribuía, não como queria, mas como podia:
Tomavas de minha água e de meus frutos, banhavas em meus rios,
Pisavas a relva que me vestia, cheiravas minhas flores todos os dias
Subias em meus montes, sorrindo, em doces e infinitos delírios.
Porém, veio o homem, sentiu ciúmes, invejou-me e para ter-te,
Depredou-me, poluiu meus rios e lagos, derrubou meus montes
Murchou minhas flores, rasgou minha relva, destruiu-me o verde;
E tu não mais sorriste, me deixaste e nem mais te banhas em minhas fontes;
calçaste teus pés com sapatos, e nem mais deslizas em minha relvas,
Andas sobre asfaltos e calçadas; - eu te perdi, não mais te vi, e chorei
Desolado, procurando-te em todos os cantos, em meio às selvas,
E por não te encontrar, novamente a Deus voltei, O vi e com Ele falei:
Senhor, permita que não mais viva assim distante, dela ao redor,
Penetra-me em seu interior, faz-me dela o rubro sangue, sua vida.
E Ele me fez o sangue da mulher amada, em Seu infinito amor,
E flui, deslizei, corri e caminhei por cada parte, a mais escondida,
E te dei cor, te fiz saudável, te fiz forte, a cada dia mais linda.
E tu me sentiste e eu te toquei, não como quis, mas como podia
E tu me acolheste afinal e habitei no mais íntimo de tua beleza infinda
E te fui vital; tu me adoraste, me curtias e tinhas medo se me perdia,
Retirado do cerne de teu corpo, em teus ciclos, qual lágrima sentida.
Até que um dia, tu te agitas, tu me agitas, me faz correr lépido
Em tuas veias; como um raio, em teu coração, qual flecha incontida,
Atravesso-o, batendo mais forte, descontrolado, intrépido.
E me vejo, impotente, expulso de tuas mãos e de tua face o alvor,
Ora gélidas, suadas; e sinto teu corpo amado em tremor crescente,
Se agitar em espasmos, fremente, bailando ao ritmo do amor,
Já não mais eras razão, dominada e guiada por paixão ardente
Amavas outro que não eu, que me perco, esvaio e sofro calado.
Sorris para outro amor que não o meu, assim, sem esmero,
Te entregas a esse amor, vives esse novo amor; e, desconsolado,
Mais uma vez, torno a Deus e falo com Ele, em meu desespero:
Senhor, a meu pedido, fizeste-me Sol, imenso, infinito, forte,
Fizeste-me Lua, plácida, serena na noite. Fizeste-me também Terra,
E depois sangue da mulher amada. Nada mais me resta senão a morte
Exangue. Faz-me novamente um homem, neste ciclo que se encerra.
Permita-me, Senhor, que more no coração ardente da mulher amada,
Faça-me o homem por quem ela vibra, por quem sorri, por quem chora,
A quem acolhe em seus braços e envolve em carinhos, mãe devotada,
Amante, amiga, enamorada. Faça-me o homem a quem ela tanto adora.
Deus sorriu, solene porém zombeteiro, e disse-me: - NÃO! -, definitivo.
Dar-te-ei o mundo, dominarás o conhecimento com belas palavras,
Serás homem, mas dela nunca será teu o coração, para sempre emotivo,
Cantarás em odes, sonetos, versos, eternamente, a mulher que amavas;
Dela nunca serás o amante, e nem mesmo por breve e fugaz instante,
Vou tirá-la de tua mente; ela será a eterna namorada, sempre presente,
Em cada um dos momentos de tua vida, e para sempre seu semblante
Ficará gravado em teus pensamentos. Serás sempre louco demente,
Amando-a a cada dia, por todos os teus dias, mais e mais intensamente
Sem tê-la, sem vê-la a todo instante, como em tuas fases de Sol, de Lua,
De Terra, de sangue. Não mais a tocarás, sequer por momento somente,
Vendo em braços de outro, enlevada, a deusa mulher que um dia foi tua.
Este será teu julgo, teu perpétuo castigo, por tua loucura desmedida,
Por teres ascendido aos céus, voado pelo éter, pretendido ser astro,
Por quereres envolver, ínfimo e infinito, simultâneo, a mulher querida,
Olvidando-te de ti, em própria vida, por ela, sem rumo e sem lastro.
Mas, para aplacar este infinito e eterno martírio, este infindo sofrimento,
Terás olhos que verão a beleza das flores, dos lírios, que cantarás em prosas
Suas cores como a da pele desta mulher; terás o olfato que por momento
Sentirá seu perfume, como quando a tinhas próxima, exalado de rubras rosas.
Dar-te-ei ouvidos que ouvirão como nenhum outro o canto plangente e soturno
Dos pássaros, música celestial que te enternece como a voz da mulher amada,
E mãos sensíveis, que sentirão a maciez de seu corpo, no repouso noturno
Que nunca mais terás, em tuas noites insones, vazias, tristes, desoladas.
E sempre que a saudade se fizer presente, colhe as lágrimas de teu pranto,
E, em tua solidão, a vagar pelo mundo, sem rumo, perdido, eremita, asceta
Componha teus versos de amor; transforma tua dor em sorriso franco,
Pois assim serás, agora e por todo o sempre, simplesmente: um poeta!