DESTINOS AZUIS

DESTINOS AZUIS I – 19 ABR 15

“O tempo corre sempre e não se cansa”,

Contra nosso coração furtiva lança,

Contra as reservas de energia avança:

Igual que um lobo, nossa alma devora.

Os pensamentos, por igual, explora;

Constrói paredes na região que mora,

Esguios palácios do tempo sem demora,

Restos dos sonhos que tivemos em criança.

Contudo, ainda que o corpo se desmanche,

Persiste a alma nas brumas do nirvana,

Como argamassa permeio aos contrafortes

E arcobotantes com que o tempo se deslanche;

Sendo as horas banderilhas com que abana

Falsos consolos para as tristes sortes...

DESTINOS AZUIS II

Será que o tempo se rasga como espaço

Nessas horas em que ponho em meu regaço

A doce amante com quem hoje me abraço,

Quando das horas se percebe a suspensão?

Será que o tempo se desdobra em afeição

No leve frêmito de seu coração,

Contra meu peito, em pura imantação,

No magnético esplendor de cada laço?

Será que o tempo se amornece em fruto,

A cada vez que me concede um beijo

E a alma, num repente, me perfura?

Será que o tempo desfalece em luto,

A cada vez que acaba esse desejo,

Após o orgasmo de centelha pura?

DESTINOS AZUIS III

E qual a cor do tempo quando escorre

E qual a cor do espaço que nos forre

Cada centímetro do chão que o passo corre,

Cada horizonte com que nos ilude?

E qual a cor do tempo quando mude

A esperança final que nos alude,

Nesse desdém que o beijo torna rude,

Quando esse amor de ontem já nos morre?

Qual é a cor de um esquecido beijo,

Nesses lábios de inquieta maciez,

Que correspondem por obrigação,

Chamas azuis do derradeiro ensejo,

A consumir o final de uma nudez

Que expõe aberto o nosso coração?

ELITROPIA I – 20 ABR 15

DIZIAM ANTIGOS QUE UMA PEDRA HAVIA

QUE TORNAVA INVISÍVEL QUEM A TINHA

E O PROTEGIA QUANDO SE AVIZINHA

QUALQUER SERPENTE QUE SENÃO O PICARIA.

CHAMAVAM-NA ASSIM DE ELITROPIA:

MALBA TAHAN A DEFINIÇÃO ALINHA (*)

DESSA PALAVRA ANTIGA QUE NOS VINHA,

POR MAIS ESTRANHA SUA ETIMOLOGIA

POIS “MOVIMENTO DAS ASAS” DEVERIA

SIGNIFICAR ESSE TERMO, REALMENTE.

Uma entidade, quiçá, atenderia

E essa visão alheia afastaria

No movimento de asas, fremente

Com que a invisibilidade nos daria...

(*) PROF. JÚLIO CÉSAR DE MELLO E SOUZA, 1895-1974, AUTOR DE “O HOMEM QUE CALCULAVA” E DEZENAS DE OUTROS LIVROS AMBIENTADOS NO MUNDO ÁRABE OU NO MUNDO DA MATEMÁTICA.

ELITROPIA II

SERÁ QUE REALMENTE EXISTIRIA

QUALQUER PEDRA TÃO LEVE QUE PUDESSE

AFASTAR AGUDO OLHAR QUE NOS ASSESSE

E NOS GUARDAR DA ALHEIA CONFRARIA?

SERÁ QUE ALGUM ENCANTO SE DIRIA,

QUALQUER INVOCAÇÃO OU ARCANA PRECE

PARA QUE ESSA PEDRA MÍSTICA NOS DESSE

UM TAL PODER QUE NOS PROTEGERIA?

BEM QUERERIA NO MEU BOLSO PÔR

UM ARTIFÍCIO COM IGUAL POTÊNCIA,

QUE SÓ MINHA VOZ ENTAO SE ESCUTARIA...

SEM ÀS VISTAS DE OUTREM EU ME EXPOR,

SOMENTE O CANTO DE ESTRANHA ONISCIÊNCIA

AOS OUVIDOS DOS DEMAIS ALCANÇARIA!

(*) ASSESSAR SIGNIFICA “AVALIAR”, ENQUANTO “ACESSAR” REPRESENTA “ATINGIR” ALGUMA COISA.

ELITROPIA Iii

APRECIARIA TER INVISIBILIDADE

CASO INIMIGOS ME VIESSEM PERSEGUIR,

MAS SEI DE VÁRIOS MOTIVOS A IMPELIR

ALGUM OUTRO QUALQUER, NA REALIDADE.

UM PARAÍSO PARA A LUCRATIVIDADE

DE QUALQUER ASSALTANTE A SE IMISCUIR

OU DE QUEM SE ALMEJARIA INTRODUZIR

DE UMA MULHER NA FINAL INTIMIDADE.

MAS NÃO SERIAM TAIS MINHAS INTENÇÕES:

SE NÃO ME MALQUERESSES, SÓ QUERIA

QUE TEU BELO CORAÇÃO ME IMAGINASSE

E SEM ME VERES, QUE CRIASSES EMOÇÕES

POR ESSES VERSOS QUE ENTÃO TE ENVIARIA,

EM QUE IMAGEM ROMÂNTICA ESTAMPASSE...

FLOR DO TIBET I – 21 ABR 15

Foi ensinado por filósofos antigos

que há, de fato, uma reencarnação,

do tempo isenta de toda escravidão,

mas partilhada por amante ou inimigos...

Que após a morte, retornássemos em amigos

ou nas pessoas que amamos com paixão

ou naqueles a quem causamos destruição:

seus mesmos corpos a nos dar abrigos...

E que vivessem de forma simultânea,

de tal modo a gozarmos todo o bem,

ou sofrermos de igual sorte todo o mal,

que praticáramos de forma subitânea,

sofrendo cada golpe assim, também,

e o próprio beijo nos daríamos, afinal!...

FLOR DO TIBET II

E se nós todos tivéssemos consciência

de que o mal que praticamos nos assalta

e que esse bem que um dia nos fez falta

fossem de nossos atos consequência,

não por castigo receber em descendência,

mas no mesmo momento em que essa malta

de nossos feitos surgisse na ribalta,

roteiro feito com antecedência,

por nossas próprias mãos e ao mesmo tempo;

se alguém matássemos, que a morte fosse nossa;

se algum ajudássemos, esse seria o nosso bem;

todos tijolos de um só e mesmo templo,

corpos trocando, sem passar na fossa

e almas cambiando por entre nós também...?

FLOR DO TIBET III

Quando olhando nos olhos de alguém mais

a nós mesmos enxergássemos no fundo,

muito mais mágoa nesse esgar profundo

do que seria provocada no ademais!...

Quando escutando cem palavras más,

percebêssemos, permeio ao som imundo,

a nossa própria voz, quão iracundo

o nosso ego entranhado no jamais!...

Que essa maldade contra nós realizada

entendêssemos por nós mesmos sendo feita,

em dupla vítima para cada má ação!...

As mães e os filhos em posição trocada,

a mesma alma que suga e a outrem aleita,

no mais perfeito amor nessa ocasião...?

BEZOARES I – 22 ABR 15

Em retrospecto, agradeço às cem Marias

que amei no meu passado com sucesso

bem obtido – ou recebido pelo avesso:

duzentos olhos a luzir em romarias!

Em retrospecto, agradeço as homilias

entoadas do amor no brando apreço,

no coração ganhando pleno ingresso:

longa trança de emoções e galhardias!

De cada uma guardei alguns cabelos;

ás vezes, uma mecha; doutras, um fio,

amarrados com fitas em novelos,

perfeitamente armazenados no meu brio,

troféus inúteis de um perdido cio,

sedas fantasmas da morte dos desvelos...

BEZOARES II

Algumas vezes, é possível encontrar,

dentro do estômago de certos animais,

esse novelo de pelos naturais

que os antigos denominaram “bezoar”.

O mais comum é nas ovelhas se buscar,

mas entre os gatos existem muitos mais

e raramente entre os cães, sem os fatais

costumes de seus pelos lambuzar...

Causam dores muita vez e mesmo a morte

esses baraços de pelos entranhados,

que lá no antanho empregavam na magia.

Algumas vezes trazem cálcio no seu porte,

em verdadeiras joias transformados

por tantas dores com que o ventre gemeria!

BEZOARES III

Assim, esses cabelos que guardei,

em qualquer canto da alma recolhidos

são por mim outros prantos escondidos

do que não tive ou de fato experimentei.

Meus bezoares dos cabelos que ganhei

foram em joias sempre convertidos,

lápis-lazúli e crisopraso revolvidos,

cristais em gotas das lágrimas que achei!

Marchetadas em meu ventre cerebral,

as suas arestas muitos sonhos arranhando,

novos rubis prendendo nessas tranças,

sem que de fato me fizessem passar mal,

mágoas somente em colares alinhando,

pérolas mortas em engastes de esperança...

SOPRO VITAL I – 23 ABR 15

Bem gostaria que subisse o medo

das profundezas ríspidas da alma

e me encarasse, olho no olho, em calma,

com suas unhas aduncas de penedo.

Uma entrevista, de pronto, lhe concedo,

à luz do dia, no forte olor que embalma

ou ao crepúsculo, que o palpitar acalma,

quando a Lua me acarinha em seu albedo. (*)

(*) Albedo é o reflexo da luz solar na Terra sobre a Lua.

Olhos nos olhos, então o enfrentaria,

para indagar o quê de mim queria

esse palor perdido na minha sombra,

entranhado na orla das pestanas

ou balançando em fio que então abanas

para esse breve susto que me assombra...

SOPRO VITAL II

Eu lhe daria um chá de erva-cidreira

e quando enfim pousasse a colherinha,

indagaria do medo o que é que o tinha

levado a se assentar nessa cadeira,

pois certamente uma razão interesseira

essa entrevista junto a mim continha,

pois nenhum medo às claras se avizinha,

sem segundas intenções – ou até terceira...

Então me disse achar-se muito só,

porque embora me afetasse a adrenalina,

era depressa demais que eu me acalmava;

e que de seu poder não tinha dó,

mas que o tingia em tom de turmalina

nesse pequeno momento em que o julgava.

SOPRO VITAL III

E eu disse ao medo que, de fato, não temia

qualquer mal que me pudesse suceder;

em pouco tempo, teria de morrer;

talvez perdesse a luz que me alumia;

talvez a música que diariamente ouvia;

ou não pudesse talvez locomover;

que meus amados eu visse perecer

ou que perdesse a biblioteca que reunia.

Mas para tudo estava preparado

e lhe queria assim contar segredo:

“se pode ser pior, estou feliz”,

por um sopro de luz sou inspirado,

no qual percebo a viva cor do medo,

tal qual amigo que um bom conselho diz...

LÂMPADA INSONE I – 24 ABR 15

São salgadas as lágrimas, mas teu rosto

recorda mais açúcar e limão,

canela, salsa, algum manjericão,

quando a língua desvaria nesse gosto.

São ácidos os vinhos em seu mosto,

porém é básico o teu coração,

no fel-doçura de minha implantação,

bem mais gentil que um raio do sol posto.

Existe luz em ti que não desaba

nesse momento em que o Sol se põe:

vives assim a me alumiar a senda

e nesse espanto que jamais acaba

cada pegada então se superpõe

nessa quimera transtornada em lenda!

LÂMPADA INSONE II

De fato a Lua perdura e não se apaga

durante o dia, tal qual que nos parece,

embora surja tão só se empalidece

esse fulgor solar que nos alaga;

deusa velada, verdadeira maga,

essa lâmpada insone nunca desce,

sobre o alpendre pendurada como prece,

que argenteamente o rosto nos afaga,

sobre nós constantemente debruçada,

não dorme a Lua quando o Sol descansa

e nem tampouco quando ostenta seu fulgor;

lá está ela, gentil e consagrada,

toda a feiura a iludir com sua cor mansa,

dando pureza ao menor beijo de amor!

LÂMPADA INSONE III

Assim a luz que vejo nos teus olhos

não se apaga sob as pálpebras cerradas:

lá está ela à espreita, perpassadas

as pupilas, em resgate dos refolhos;

os negros cílios meramente antolhos

para visões alheias apressadas,

para minhas vistas sempre apresentadas,

faróis ligeiros contra meus escolhos...

Até mesmo sem saber, tu me proteges,

ao devolver o olhar que te dirijo,

nesses cristais de pranto cor de sal;

e bem queria então que assim adejes

sobre meus olhos como adaga rija,

dos pesadelos afastando todo o mal.

TURQUESA E TURMALINA I – 25 ABR 15

Faces rosadas como a corticeira,

olhar azul da cor do caruru,

minha amada, com cabelos cor de anu,

em seu sorriso de maga feiticeira;

e nos cantos dos lábios, derradeira,

uma gota de saliva, oriental Fu (*)

me protege do rigor o peito nu:

que não me assalte a maldade interesseira!

(*) Espírito protetor chinês, mistura de cão e de leão.

A minha amada tem olhos de botão

dessas flores de buscada perfeição,

em que o lápis-lazúli se reclina;

e com tais olhos cintilantes de paixão,

em cada téssera gotejante de emoção, (*)

ainda controla a senda de minha sina.

(*) Pequenas pedras coloridas utilizadas nos mosaicos.

TURQUESA E TURMALINA II

Faces morenas como a terra arada,

tem olhos verdes a mulher que amo,

que me contempla no ciúme do reclamo,

no velho adágio ao jade comparada.

Ela se mostra fértil e abençoada,

ao receber o ardor com que a conclamo

e a persigo com meu andar de gamo:

tal corça é bela e de pelagem delicada.

A minha amada é doce cotovia,

na proteção de seu ninho desvaria:

de fato, o ama mais do que a mim mesmo;

e assim lhe trago os restolhos da poesia,

que ela retrança em cestos de harmonia,

acimentados por verso feito a esmo...

TURQUESA E TURMALINA III

E são castanhos os olhos de minha amada,

pois disfarces são apenas os demais;

são melaninas os pigmentos naturais:

tudo depende da luz capturada...

Mas olhos negros não tem a idolatrada,

pois que somente os possuem os animais;

os mais escuros são castanhos por demais,

tão concentrada a cor apresentada.

Pois minha amada tem olhos furta-cor,

iridescentes no amarelo que reluz,

no heptacromo que cria a refração

e ali encontro a reluzir a meiga dor

de cada olhar que a meus olhos se conduz

e faz ferver ali a exaltação...

PRINCIPESSA I == 26 ABR 15

Inicialmente, nem sequer a notaria,

não era mais que um vulto de passagem;

minha indiferença lhe cobria a visagem,

tal qual cenário pelo qual me moveria;

mas pouco a pouco, notar-se ela faria

e no primeiro plano da portagem

de mim já exigia a vassalagem:

que a percebesse de mim demandaria;

e fatalmente entreguei-me a essa presença,

como um vassalo, tal qual me requeria,

até a completação total do giro,

que ao ver-me firme na sua rede tensa,

fez-se em princesa que não mais me via,

de quem me despedi com um suspiro...

PRINCIPESSA II

Assim aquela que um dia foi mendiga

da intempestiva visão do meu olhar,

após ter-me adquirido em seu passar,

não me deixou ser dela mais que auriga; (*)

(*) Condutor, cocheiro, chofer.

e tão logo melhor carro ela consiga,

já sem de mim sequer se recordar,

seus dois sapatos de cristal a carregar,

de novo amor se fará fiel amiga...

Tentada em vão a invocação de espelhos,

sombra furtiva nem pude abraçar,

nem seus perfumes para mim voltaram;

quebrei a harpa na rótula dos joelhos,

lancei as cordas sobre o verde mar

e nem sequer em algas se tornaram...

PRINCIPESSA III

Assim ocorre com frequência demasiada,

que as coisas para nós só têm valor

após perdidas para o nosso amor,

em fantasia no passado debruçada;

correm os sonhos qual lesta cavalhada,

seus cascos ressonando em estridor;

passam as ondas nas espumas do cantor,

depois da nave estar algures arribada...

Cada quimera a furtar outro nitrido

e cada vaga a matar um rouxinol:

é só então que o amor nós avaliamos,

perdido o canto para nosso ouvido,

dança o batel à luz de outro farol

e no vazio da margem nos achamos...

MANHÃ DA NOITE I – 27 ABR 15

O tempo gira em volta como o vento,

um pouco me acalenta ou me sufoca;

o som do tempo a meu redor espoca

e como o vento, o tempo gira lento;

o tempo gira para meu tormento

e passa o vento e gira e assim me toca

esse girar do tempo que reboca

o desgaste do tempo e do lamento;

lamenta o vento pelo tempo lento,

tormenta o tempo pelo vento antigo

no qual o vento, tal como o tempo, gira;

torna ao redor de mim no seu portento

o tempo lento, o vento que me mira

e o desgaste do vento é meu jazigo.

MANHÃ DA NOITE II

Mas se eu pedisse ao tempo que voltasse

para o tempo do passado, brevemente,

seria o seu girar mais inclemente

quando o passado em torno a mim girasse,

caso a manhã da noite se estampasse

sobre o crepúsculo de girar dolente,

seria o giro do vento mais potente,

tal qual se o giro do tempo desgastasse,

visto que a tarde da noite é a alvorada,

quando ela morre ao dar à luz o dia,

no dilúculo seu parto entre gemidos;

e quando o dia se extingue em quase nada,

retorna o tempo a girar em nostalgia,

dançando ao vento dos dias já perdidos...

MANHÃ DA NOITE III

Mas se eu pedisse ao tempo que se fosse,

para girar nas testas de outra gente,

seria o vento até mais inclemente,

por minha fraqueza perante ele expor-se;

e se eu pedisse ao vento ser mais doce,

perante o azedo do tempo descontente,

o tempo inteiro giraria velozmente,

nessa ironia de que um dia me remoce;

pois gira o vento a ressecar-te a face

e gira o tempo a quebrantar-te a vida,

nada restando para ti que a louca dança

em que o dia como noite se estampasse

no teu rosto, em calmaria desmentida

por baile doido de que o tempo não se cansa.

ADEMANES I – 28 ABR 15

Aonde eu for, te levarei comigo,

mesmo transpostos os portões da morte;

não acredito que esse final corte

me roube o pouco de ti que ainda consigo

conservar nos meus nervos em abrigo,

cada gesto demarcado por teu porte,

cada doçura ou azedume forte,

o mármore a formar do meu jazigo...

Aonde eu for, tal qual o coração,

nesse seu ritmo às vezes desolado,

é que de fato me conduzirá

esse murmúrio feito de ilusão:

cada trejeito a que fui atrelado,

que até o final minha mente prenderá.

ADEMANES II

Cada momento algures que te vi

tenho gravado entre as redes neurais,

em arquivos semióticos finais, (*)

que voltarão a conduzir-me a ti;

(*) Arquivos de significado.

em cada porto do cérebro inseri

essas lembranças de fomes perenais,

sobrenadando a quaisquer outras que tais,

cada instante do passado que vivi;

não é, porém, tal qual te aguilhoasse,

pois de ti retirei tão só reflexos

e nunca essa verdade que tu és;

que em mim somente esse espelho se estampasse,

no meu ergástulo de perdidos nexos,

conservados pela força de minhas fés.

ADEMANES III

Por isso, no meu cérebro é que pesam

os atributos antigos da memória,

os singulares momentos dessa história:

outras lembranças apenas é que lesam

e os julgamentos mal e mal sopesam;

quaisquer recordações de alheia glória

a descartar de forma peremptória:

somente tuas as ladainhas que rezam...

Guardo de ti a saga carmesim,

que em meus neurônios firmemente dói,

jamais cambiada por outros desejos;

e desse modo, se algo eu levo, assim,

é só o fantasma de um sonho que já foi,

por mais reais que fossem os teus beijos.

William Lagos

Tradutor e Poeta

Blog: www.wltradutorepoeta.blogspot.com