agora é pra fazer de conta
já pensou se o maracanã fosse um piscinão
já pensou se um túnel ligasse nossas cidades
já pensou se todo não
fosse um talvez anti-ansiedade
– se bem que todo talvez é uma merda
mas, já pensou?
já pensou se a internet passasse cheiro
aí então ele poderia sentir
o levemente acre olor das axilas dela
o olor levemente acaramelado de suas virilhas
já pensou se eles marcassem um encontro
já pensou se ele fosse
já pensou se ela estivesse esperando
já pensou se fosse numa estação de trem
já pensou se os alto-falantes da estação
tocassem janis joplin
e os cheiros
e se os cheiros fossem tão bons
quanto aqueles que sentiram ao computador
já pensou se houvesse tele-transporte
já pensou se o amor fosse esporte
já pensou se a sorte fosse nossa irmã
já pensou se eles fossem ao rio
e nadassem na piscina do maracanã
e se passassem ilesos pelo anti-doping
e se secassem no mormaço até o shopping
e enchessem o shopping de poesia apaixonada
e se todos ficassem paralisados, como em matrix
e se eles dois fudessem na escada rolante
e se pilotassem a máquina de milk-shake
do shopping fantasma
do shopping cheio de manequins de sangue vivo
os manequins de estátua quente
já pensou se ela engravidasse
e a eletricidade daquela concepção
descongelasse a multidão
e a semente dele, dentro dela
fizesse gerar um santo
e, no caminho de volta, no trem
eles saberiam que barriga era aquela
que aquarela eles eram
rapaz e moça
homem e mulher
garfo e colher
e a fome insaciável dos que comem da vida
não dos que devoram a vida
mas dos que a saboreiam
e eles, agora, no trem, de mãos dadas
sabem do sabor da vida
sabem do saber dos santos
e o espanto da semente santa
que um dia vai ver luz branca
e vai chorar estando na luz
e seu choro de vida os fará sorrir
como jamais haviam sorrido
mas, já pensou se a semente líquida
caísse na escada rolante
e, naquele instante
a vida voltasse ao normal:
ele, lá, no seu computador
ela, acolá, idem, bastante longe
na janela o frio sol vermelho distante.
*