E se tanto és em mim, ó meu amado
Em ti, amado, descansa o flato desta tarde
e a chuva miudinha dos meus olhos,
quando, numa só palavra, num gesto brando,
num gesto horto e criador, selas num beijo
as dores agudas duma jornada salgada de dor.
E as rosas mais bravias do jardim,
e os galhos ressequidos, crestados e quebrados
e os pássaros ressentidos, magoados, logo feridos,
agrilhoados na placidez algodoada dos ninhos,
reflorescem em intempéries de Arlequim
E as nuvens, uma a uma, a aragem lavam,
e das fontes se solta o verdor tenro d’ avencas,
no frenesi libertador de cismas e caprichos,
na cor virgem d' águas setentrionais
e, do topo daquela inopinada frágua,
sugas ávido o néctar descosido dos meus seios.
E os meus braços são abraços no teu
corpo e o teu corpo o meu divino porto…
E se tanto és em mim, ó meu amado,
e se em mim explodem desejos de mansinho,
e se do teu corpo, anseios, dragões de fogo,
que me guardam, moira encantada, em torreões,
em castelos e ameias - altaneiras e tão breves -,
se são só meus, todos os poemas que escreves,
ama-me agora, amado, nesta tarde, nesta hora
na melancolia incendiária de diferida tempestade,
numa dulcíssima ventura que, sem ti,
não encontro o céu estrelado,
sem ti amado, tudo venta, chuva e chora.