Madrugaste em mim sem ter amanhecido
Deslizo na tua boca de vigílias agrilhoadas
em espinhos famintos de negras rosas
na dor imposta desta nossa distância.
Bebo do delírio coralino dos teus olhos
o vinho ébrio e o brilho falacioso
de prometidas d’alvoradas.
Viajante de um tempo sem memórias,
em arestas buriladas aos ventos do mutismo,
navegaste o meu corpo de amurada
em auroras despidas de claridade.
No entalhe d’artes emboscadas
falaste-me de ternuras, de sedas fartas,
resguardadas no porão da tua nau, em paliçadas,
e de uma planície alaranjada sucumbida em trilhos
calcorreados no trigo louro de fim do dia.
Cantaste-me a sede do meu corpo
num verbo desvendado, povoado de disfarce,
urdido em cometas e em estrelas diurnas.
Em espíritos fundos de saudade acesa.
Madrugaste em mim sem ter amanhecido
e partiste, ainda a noite respirava dia,
ainda a noite temia sucumbir em agonia
à fragrância sulfúrica do meu corpo
que, solitário,
tesouro não desvendado, ali morria.