Cochilo

Cochilo

Sabe, o que sinto agora inunda algo aqui

Sei que não é seco, invade meu âmago

É ao mesmo tempo inquietação e silêncio

Não quer se revelar, mas arrepia

Costumo não nomear, limita

Prefiro não falar, sinta

Erro letras músicas, cantarolo

Deito em teu colo, adormeço

Imagino mais de cem hamartias

Será que tem nome tal calma?

Será que a angústia da ausência é chama?

Será que quando voltar ainda me ama?

Ando com cinzeiro pra não ter que remediar

E se me prego em tuas curvas, sinuosas

Enfrento coisas que não vi, estradas perigosas

Acendo os faróis, ou os lençóis?

Estou enebriado, ébrio grito, é tudo asfalto!

Se me enche de prazer, é porque gritei

O peito ainda é nu, onde estão suas roupas, não sei!

Enquanto isso me cubro de bênçãos que é pra purificar

Rezo um terço, toco tambor, deixo minha fezinha pra lá

Posto que se não me entrego, queima

Visto que já não mais sinto, deixo queimar

Estou já adaptado, bombeiro calado

Esguichos devem me acomodar

E se não encontro rumos em outras fontes

Serão velas, defuntos ou amantes?

É só frieza, falta de personalidade, definição objetiva demais

Inteiras verdades...

Quando o que quero é só você e a indefinição

A racionalidade clara que é ser você mesma, irracional

Essa excentricidade de ler Chico Buarque e rir de filme nacional

Faltam-me adjetivos, rodei dicionários, és caso a parte, o inteiro fragmentado

Se olho no espelho e vejo minha face, é poque não envelheci

Se hoje sou quem era ontem, não foi contigo que dormi

Se no meu peito bate calado um coração “apaixonado”, não era por ti

Mas reconheço de longe e nunca me esqueço,

Do meu ego e meus desejos, avessos

De querer calmaria quando tenho clarão

Procurar você na imensidão

Agulha no palheiro, achei você,

Fagulha de minha paixão

Cansei de escrever, ando cansado

O peito ainda tem marcas de tuas unhas

Não sei se falo a verdade, ou se trespasso

E nesse compasso bambo de mim

Vou vivendo assim,

Correndo bêbado pra não cair em telhados

Construindo muros para viver isolado

Cavando covas rasas, epitáfios calados

Vivendo nauseado, nunca nauseabundo

Sou o avesso do que quero, o que sempre quis ser

O eu diferente, no teu colo, apenas mais um demente

Aquele que dormiu e quando acordou

Esqueceu-se de si, vida pela frente

Gabriel Amorim 23/05/2014