Sigo aprendendo
Aos poucos sonhos e lembranças misturam-se
Dentro de um tempo muito não existirá na história
Cidades inteiras apagar-se-ão em minha partida
Pois apenas tem vida em minha memória
Valores antes tão certos agora tão bobos
Não tenho mais a quem esperar
Foram-se a amada, um filho, todos os amigos
Mas alegro-me com quem há de chegar
Minhas vistas turvas teimam firmar em cenas borradas
Os passos firmes de outrora se arrastam diminuídos
As mãos que não se esqueceram o toque estão no colo largadas
Ainda guardo abraços nos braços enfraquecidos
Saiba que repousa em mim o antigo menino
Ora salta ora medita em poesias retidas
A Alfazema tem inveja de um mimo
Os Almíscares são lágrimas vertidas
Lembro-me de encostas que já não são
Muitos cursos foram alterados
Rios lindos consumidos na poluição
Grandes veredas e vales inundados
Superei muitos medos outros me venceram
Inventei recursos recusei discursos
Vivi plenamente não dormi demais
Meti os pés pelas mãos como todos os mortais
Já vivi tantos anos que às vezes confundo-me
Penso tratar-se de outra vida a que ainda estou vivendo
Ela virá, eu sei
Mas enquanto não chega sigo aprendendo.
Pedra
Homenagem ao meu querido pai, por já 96 anos.
Frase original dita, com freqüência, pelo papai:
"Ela vai chegar, mas enquanto não chega sigo aprendendo e se for agora, vou contrariado"
Vicente Bruno
Nunca imaginei poder publicar mais uma vez esse poema.
Sinto-me imensamente feliz.
No dia 10 deste mês, papai completou mais uma primavera:
Cheio de saúde, alegria e causos para contar.