Homem de Cristal
Taça de cristal nas tuas mãos; eu era assim;
Vezes passavas o dedo em minhas bordas
E eu cantava de prazer, feito um clarim.
Guardado sob o melindre de seus cuidados,
Quando me roçavas os lábios... Ai de mim!
Estremecia como em noites de frio...
Sorrisos, festas e alegrias. Mil tintins.
Um dia. Embriaguez de vinho estranho.
Meu tombo foi tamanho e tão medonho,
Que, arrebentado em mil pedaços eu me vi;
Agora, aos frangalhos, em tarecos e estilhaços, .
Varrido da face dos lábios e das festas;
Tu pisavas em meus cacos, distraída...
Eram tantos e tão pequenos, quase sem vida
Mas cravavam em seus sapatos em desespero.
Meu medo era perder o dom das poesias,
Melar o que há de bom nas melodias,
Cantar a dor atroz das métricas e das rimas;
Noutras verdades, noutros sonhos, noutras bocas...
Ah, e tu, da embriaguez uma vez refeita;
Foste tentar colar os meus caquinhos.
Pois saiba, doce musa distraída, desastrada,
Que no vinho está a verdade nua e crua.
Terás de beber com outra bocas, em outras taças
Que para ti, a que quebraste, vale nada.
Carlinhos Matogrosso.