PORQUE UM NIILISTA RARO AMA
No dia em que cheguei
em teu caminho,
abriu-se-me,
muito estranhamente,
um impávido outono
com sonhos de asas;
e no desalinho mundano
em que nos pusemos
a andar,
às vezes, à nau dos ventos
e das procelas,
sucederam-se muitas
coisas:
de céus cingidos
com dádivas
etéreas
e gestos enredados
com desejos
íntimos,
às insânias dos verbos
irados
entre chuvas de fogo
e de cinzas.
E, apesar de tudo,
talvez ainda nem acredites
que eu te ame
por não entenderes
meus versos
loucos,
ou por não compartilhares
meu niilismo
imanente,
ou por permitires
que tua mente nos fabrique
a morte fria
com conflitos angustiantes
de imagens tênebras,
que te torturam
nas noites insones.
Fico a pensar que,
se não conseguirmos
olvidar o mundo
para conquistarmos a sublimidade
de um amor nuvem,
pode ser que,
algum dia,
venhamos a nos perder
nos bailes ominosos
das fantasias,
onde constroem outras
estranhas quimeras.
Mas,
mesmo se assim o for,
e que haja em ti
outros amores ávidos,
outros fervores cálidos
e outros sonhos grávidos,
em algum momento,
no silêncio íntimo das reminiscências
do perdimento concreto,
ao som daquela nossa
canção,
muito diferente,
a brisa nos trará lembranças
amargas,
e abrir-se-á uma ferida
na alma
onde a dor escorrerá
em soluços e lágrimas.
Péricles Alves de Oliveira