Me vejo em ti
O dia nasce. Abre as cortinas do teu tempo.
Faz ressurgir o ânimo que abandonaste noite passada.
Põe para fora esse ser que dorme em teu íntimo.
Esbofeteie a cara e cale voz que te declina ao sono.
Refaça os passos de outrora. Deixe a redoma.
Me vejo em ti, com medo, assustado.
O dia te espera, tal qual noivo apreensivo.
A vida clama por tua presença. Mostre-se!
Tua existência não vale pouco, por isso te oneras tanto.
Custa muito o que vale muito. Viver não é uma excursão.
Abra as portas de tua casa. Dê seu corpo ao mundo.
Oferte à ele o que tiveres de melhor. Entregue-se.
Entregue-se ao mais puro exercício de ser alguém.
Deprima-se de vez em quando, mas que seja por apenas um segundo.
A vida por si só pode acabar no segundo seguinte.
Me vejo em ti, contra a parede das dúvidas e cobranças.
Aquece teu coração entre gravetos flamejantes de esperança.
Confia! Nada que deténs é de teu extremo interesse.
Aquilo do que dependes, não está em teu controle.
O ar, vem e vai. Não é teu! A luz, dá lugar à escuridão. Não é tua!
O que deténs? O efêmero? O supérfluo? O inútil? Nada?
Responda diante do espelho, melhor crítico no desespero.
Pergunte-se e não fique sem resposta. Não perca para si mesmo.
Me vejo em ti, carente, solitário, melancólico.
Saia! Bata firmemente os pés calçados no chão insensível. Vá!
Busque tirar de ti mesmo o melhor, e não cace-o nas entrelinhas.
Elas serão tua evidente fraqueza. Mesmo que saibas quão forte és.
Me vejo em ti, resignado, confiante, ciente do mundo.
Siga, não pense no passado. Se feriu, se alegrou. O nome é passado!
Inquiete-se pelas coisas certas. Nunca por quem preferiu outro abraço.
Por quem preferiu fechar a porta em vez de abrir os olhos.
Sou tua alma. Tua essência. Me vejo em ti.