OS AMORES DO MUNDO
Um, açougueiro, corpo café
Olhos picantes, cheiro de mato
Mãos flutuantes, abraço inclinado
Sorriso guiné.
Outro, advogado, olhar azulado
Demente, um herói.
Inverno contínuo, casulo fechado,
Menino perdido, olhar que destrói.
O último gargalha aos montes
Sussurra e conquista, se apega ligeiro
Amor atrevido, amor de uma vida
Amor quente verdadeiro.
Amor de uma noite, quarto disparo
Sem nome, sem lastro, ninguém quer falar
Se branco ou se negro, se pedra ou se pó.
Melhor esquecer, talvez nem lembrar.
O quinto opróbrio do alto escalão
Gravata ajustada, maleta na mão
Sem paz, sem medo e sem verdade
Ato de contrição.
Há tantos amores no mundo
Amores perdidos no riso, amores de flores
Amores de gelo e amores de mel.
Amores de feira, de doces, de fel.
Amores que terminam quando acabam
Amores de sexta feira
Amores de domingueira com marcas de malte
Aromas de alfazema e laranjeira.
Amores sem iguais, faceiros, vezeiros
Há amores companheiros, amores fatais.
Há amores de verão, amores sem vergonha
Que vêm e vão, e vão, e vão...
Há também amores de viagem
Guardados na mala, fetiches, cinema
Amores de veludo e espelhos
Rouge carmim, amores treponema.
De pires na mão à espera de esmolas
Há amores falsos, descalços, dançarinos
Amores perdidos, desfeitos e arrependidos
Abandonados, esvaziados, amores ferinos.
Amores de mentira, amores vencidos.
Amores sem crédito, sem pão, sem razão
Há também os amores necessários
Aqueles herdados, que têm compaixão.
Há amores gratuitos, rifados, comprados
À margem de tudo, negados, cisão.
Amores sem preço, de pura coragem
Se matam, se morrem, se emprestam, se dão.
O sexto, sentido, amor cuidadoso,
Suado, ofegante, perfil sem defeito
Poeta, escritor, gentil cavalheiro
Olhares pra lua, disfarce perfeito.
Amores de luz que nascem e crescem
Gritam e choram e lançam ternura
Mãos tão pequenas, olhares profundos
Matizes de encanto, galopes, travessura.
Amor animal, pesado e descrente
Amor nirvana, amor serpente
Amor igual ao meu, ao seu
Amor Igual ao de tanta gente.