Na mais tenra incerteza

O tom da sua voz...

Eu não entendo.

Digo: Que queres?

Tu dizes: Água.

Eu busco água, creio que é o líquido que carrego.

Dou-te, sem cuidado, na boca.

Deixo escorrer, vazar...

Você não sacia. Ou sacia. Não era essa a água?

Pergunto: Quem és tu?

Ris de mim, dizes: Fogo, prazer.

E penso que dizes como um alarme de perigo: “proteja-se!”.

Depois creio ser um aviso íntimo: “arder”.

Sorrio junto, ponho em prova tua resposta.

Tu brincas... Eu com fogo.

“O fogo derrete a cera” - não há de ser de cera meu eu!

No entanto... “Cera”, que “será”?

Minha loucura feminina dá ênfase demais ao som das palavras escritas... Sinestesia malsucedida. Delírio.

“Ser a que?” Ser para nada! Nadar?

É água que queres...

Como pode o fogo querer a água?

Mentiras... Labirinto. O som saído dos dentes é lentamente deixado para trás. Deixa a eloquência banal: que sentes, meu eu?

Retrograda, questiono: Estais a mentir!

E você some como o ar. Passa da segunda para terceira pessoa.

Já não sei te alcançar, nunca o soube.

O busco na caçada por água. Na cachoeira, na praia, no pântano...

Rasgo a pele, mas a água que circula é o sangue tão só meu, vazio de você.

Só no deserto te encontro, na escassez, no nada.

Eu: Você quer beber ou nadar?

Você: Voar!

E eu não entendo.

Deixo de questionar, enfim.

Sabendo que você é aquele que jamais responderá.

Entrega-me ao desconhecido. Eu faço ilusão.

Expectativa de que não me deixes,

Não me digas sim ou não.

Expectativa de que não me deixes

Na inteireza da certeza,

Desmistificação.

Que queres, quem és...

Que importa?!

Te amo na terra, na mata,

No esconderijo fixo dos corpos.

Na mais tenra incerteza.