VIÚVOS (A CASA DELES)
ESTE POEMA É PARTE DO MEU LIVRO "JEITO FACÍLIMO", ESCRITO ENTRE OS ANOS DE 1998 E 1999.
VIÚVOS (A CASA DELES)
O VIÚVO:
AS PAREDES TÊEM SENTIMENTO:
DIPLOMAS, RETRATOS, CAMADAS ANTIGAS
DE CORES, POEIRA ENFEITE DE FLORES
TEZ CORTINAS, OUTROS TEMPOS...
RABISCO DE LÁPIS, PRÉ-SILÁBICO NOME, OS FILHOS:
DEDO DE GRAXA NA MANHÃ DE DOMINGO!
MAS LEMBRANÇAS SÃO SÓ LADRILHOS.
E NÃO HÁ DOAÇÃO DE PERTENCES (INÚTIL)
QUE ESFARELE O TIJOLO DA ALEGRIA:
PORQUE O CUPIM DO TEMPO SÓ COME
AQUILO QUE PODE MORRER.
É POR ISSO QUE O VIÚVO
PENSA LOGO EM VENDER A CASA.
A VIÚVA:
CHi CHi CHi CHi CHi... A PANELA DE PRESSÃO
Xiiiii... (SILÊNCIO!) FAZ O SEU CORAÇÃO.
MAS JÁ NÃO EXISTE CHEIRO ALGUM!
QUEM ABAIXOU O FOGO DO FOGÃO
SE AINDA HÁ COMIDA PRA UM?
NÃO TEM MAIS MESA POSTA,
MAS A TOALHA INDA É A MESMA.
AS FLORES JÁ ESTÃO MORTAS
MAS OS CRAVOS, QUE BELEZA!
TEM MUITA LOUÇA SUJA,
MAS HÁ NO PRATO A SOBREMESA!
OS FILHOS NÃO TÊM MAIS TEMPO
SÓ O NETO SE DEMORA.
SÓ QUE OS NETOS TAMBÉM CRESCEM,
MAS UM BISNETO CHEGA AGORA!
O PEDREIRO NÃO CAPRICHA MAIS...
O LADO VAZIO DA CAMA ESPICHA, ATRAVESSA QUINTAIS.
É POR ISSO QUE A VIÚVA SEMPRE TOMA MAIS TEMPO
PRA ARRANJAR UM NOVO AMOR.
23 de setembro de 1998.