DEVANEIOS

Saudades eu não tenho

Tenho dor no coração

Porquanto os que me estimavam

Em face depõem o que não mais são

Ouço rios enquanto caminho

E desejo que o siso lhes tome a vida

Ouço quimerizar minhas palavras

E vejo minha última despedida

Acordei faz quatro horas

A madrugada se veste de um negrume cimério

Clamei-lhes que me depusessem

E levassem meu coração cinéreo

As ruas se esparramam de ilusão

Os vilarejos se perfumam de soturnidade

Urubus cantam minha dor,

E eu me escondo ali na esquina da saudade

E passo a auscultar a Morte

Pois, posto que a encontre breve

Dir-lhe-ei o quanto já não existo

Sem o amor da minha doce amada

Foi o amor que me deixou assim

Quando ouvia o sussurrar baixinho

De um que indagou a tal inércia

E então suplicou à Morte a meu querer

Para que morra feliz e não triste

Que tenha amigos sinceros no viver

E que neste sentido o meu rosto

Não seja o traço do desprazer

Então caminho pela rua

A morte é um velho triste na esquina da saudade

Um vento forte sopra em minha direção

E eu vou, sujo e alado pelos ares de claridade

O céu estrelado aguarda um clarear repentino

E o velho cálido emana rubra luz

Faz-se forma de abutre e se desmancha em corvos

E os corvos se decompõem em urubus

Pergunto ao vento, indago à solidão

“Como viverei sem teu amor?”

Como haverá a brisa sem a baixa pressão?

Como haverá arco íris se a chuva fosse um ator?

Onde estará agora a Morte?

Leva-me e me poupa tamanha tortura

Sentei na calçada. Comecei pensar

Como seria minha vida assim tão dura...

E lá de cima uma estrela sussurrou

Contempla os olhos de tua amada!

E entrega-lhe os beijos que não deu

Desce estrela! Desse por esta escada!

Então gritei pelo teu nome

Mas quem respondeu foi o velho mendigo

Na esquina da saudade, perto do meu coração

Caminhei pela rua erma e hirta (do perigo)

Porém, a Morte esquivou-se,

Parti até a casa do meu amor proeminente

Na mesma hora em que na casa ao lado houve um pranto

Abriste a porta, já não doente

Eu estou aqui ainda devaneando

A aurora me segue, quer me deter

E teu rosto, teu amor, o teu abraço...

Foram como palavras me ensinando a viver...

jairomellis
Enviado por jairomellis em 24/03/2007
Código do texto: T424359
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