A MULHER

(A C...)

A mulher sem amor é como o inverno,

Como a luz das antelias no deserto,

Como o espinheiro de isoladas fragas,

Como das ondas o caminho incerto.

A mulher sem amor é mancenilha

Das ermas plagas sobre o chão crescida,

Basta-lhe à sombra repousar um’ hora

Que seu veneno nos corrompe a vida.

De eivado seio no profundo abismo

Paixões repousam num sudário eterno...

Não há canto nem flor, não há perfumes,

A mulher sem amor é como o inverno.

Su’alma é um alaúde desmontado

Onde embalde o cantor procura um hino;

Flor sem aromas, sensitiva morta,

Batel nas ondas a vagar sem tino.

Mas, se um raio do sol tremendo deixa

Do céu nublado a condensada treva,

A mulher amorosa é mais que um anjo,

É um sopro de Deus que tudo eleva!

Como o árabe ardente e sequioso

Que a tenda deixa pela noite escura

E vai no seio de orvalhado lírio

Lamber a medo a divinal frescura,

O poeta a venera no silêncio,

Bebe o pranto celeste que ele chora,

Ouve-lhe os cantos, lhe perfuma a vida...

- A mulher amorosa é como a aurora.

São Paulo, 1861.