VIDA DE FLOR
Porque verga-mês a fronte sobre a terra,
Diz a flor da colina ao manso vento,
Se apenas às manhãs o doce orvalho
Hei gozado no momento?
Tímida ainda, nas folhagens verdes
Abro a corola à quietação das noites,
Ergo-me bela, me rebaixas triste
Com teus feros açoites!
Oh! Deixa-me crescer, lançar perfumes,
Vicejar das estrelas à magia,
Que minha vida pálida se encerra
No espaço de um só dia!
Mas o vento agitava sem piedade
A fronte virgem da cheirosa flor,
Que pouco a pouco se tingia, triste,
De mórbido palor.
Não vês, ó brisa? Lacerada, murcha,
Tão cedo ainda vou pendendo ao chão,
E em breve tempo esfolharei já morta
Sem chegar ao verão?
Tem piedade de mim! Deixa-me ao menos
Desfrutar um momento de prazer,
Pois que é meu fado despontar n’aurora
E ao crepúsculo morrer!...
Brutal amante não lhe ouviu as queixas,
Nem as suas dores atenção prestou,
E a flor mimosa, retraindo as pétalas,
Na tige se inclinou.
Surgiu n’aurora, não chegou à tarde,
Teve um momento de existência só!
A noite veio, procurou por ela,
Mas a encontrou no pó.
Ouviste, ó virgem, a legenda triste
Da flor do outeiro e seu funesto sim?
Irmã das flores à mulher, às vezes,
Também sucedeu assim.
São Paulo, 1861.