HOJE ESTOU SÓ
Hoje estou só.
Meu amor pegou um barco
e foi para o lado esquerdo do rio.
Lembrou de coisas
do mês de abril
e teve um medo cortante de mim.
Hoje estou só.
Aproveito e leio
os meus amados poetas.
Deixo a luz entrar
e as janelas abertas
me mostram a cidade
na qual não estou.
Ela bebeu o líquido
guardado na garrafa do medo.
Acordou muito cedo
e saiu.
Não disse se voltaria,
se hoje, se em abril.
Disse que já não sabia
se era amor,
se era rotina,
o que sente por mim.
E eu fiquei só.
A solidão não me aflige.
Aflige-me a cegueira
com que conduzo a vida.
As palavras que não digo,
o amor que encubro,
amor pulsante e rubro,
mas calado, cansado:
isso é o que me aflige,
estar junto dela
e estar só.
Hoje estou só
de um estar só literal.
Não vejo seus olhos,
não sinto o seu cheiro
e a cor de seu cabelo
não enfeita a paisagem.
Se ela voltará?
Só posso dizer
sei lá.
Talvez eu me liberte
quando começar a chorar.