A BORBOLETA MAGENTA & MAIS

a borboleta magenta I (17 nov 12)

a borboleta sobre o quebra-luz

seu corpo rosa-choque e suas antenas

apenas pousa, sem sequer vibrar

transfixada em invisível cruz

pousada imóvel, refletindo apenas

o que a vidraça lhe dá de luz solar

a borboleta foi feita quadrialada

asas opacas de esplendor magenta

pontos brilhantes de pendor azul

sobre textura transparente e nacarada

de outro par que o abajur frequenta

no viés manso dessa luz do sul

o quebra-luz de bronze e de cristal

recebe a borboleta em sua campana

está apagado e não lhe causa qualquer mal

a borboleta magenta II

de onde vem a estranha borboleta

por que fresta adejou, por que fissura

esse inseto maior que mariposa?

qual o motivo, qual intenção secreta

que ela trouxe, em seu mistério de ternura

ali aplicada pelos dedos de minha esposa?

eu reconheço que seja artificial

adquirida por entre variedades

empoeiradas de quinquilharias

grande demais para inseto natural

bela demais em sua teia de vaidades

morna demais para minha nostalgia

talvez seja chinesa importação

como essas flores que nunca se emurchecem

em seus vasos de perpétua brotação

a borboleta magenta III

o quebra-luz tem borlas esverdeadas

pingentes púrpura descem desde o teto

entremeados de contas multicores

num ikebana de formas encadeadas

da terra, homem e céu mostram aspecto

em seus orgulhos tão enganadores

contra o pano de fundo do lambril

que reveste as paredes desse quarto

há uma raposa trazida da Bulgária

num toque medieval ou feminil

sobrou a pele apenas desse parto,

morta lembrança de excursão atrabiliária

e a estrutura permanece quieta

dos fogos-fátuos de atento artesanato

transformados em magenta borboleta

a borboleta magenta IV

mas nos ouvidos sussurra a fantasia

foi essa a borboleta de Shanghai

que bateu asas e provocou um tsunami

e espantada com o desastre que ela cria

para as alturas imponente vai

até que a voz de uma mulher a chame

e ela cruza urgente a estratosfera

a atravessar silente os hemisférios

buscando entrar pela fresta da janela

bem recebida após a longa espera

aqui achando repouso e refrigérios

contra o creme da lâmpada amarela

que a borboleta irradiada de mil cores

contempla agora e abençoa alada

esse leito em que adormecem meus amores

água de melancia I (13 dez 12)

no lado oculto do sol

que nunca se vê da terra

é cor-de-laranja a guerra

são pontos negros farol

verde oposto ao arrebol

e escarlate cada serra

a aurora nele se enterra

cegos olhos nesse anzol

no lado oculto do sol

vermelho de melancia

a terra gira sem rumo

e se tornou em terçol

quando teus olhos não via

as lágrimas feitas em grumo

água de melancia II

girando em torno da lua

a minha alma envidadeira

se enrola qual trepadeira

e vejo como se amua

o astro de expressão crua

de antiga varíola herdeira

não tem face hospitaleira

entre os vulcões de sua rua

a lua é grande demais

para ser nosso satélite

e a terra também atrai

amor não morre jamais

de teus olhos sou tu-télite

que contra ti se contrai

água de melancia III

mas eu-télite não és

a girar em torno a mim

eu fico no balancim

tu permaneces nas sés

sou dervixe nos meus pés

girando como alecrim

quando o vento bate assim

emelodiado em balés

quando as narinas expiras

e os olhos batem de novo

nessas pálpebras sem dós

que por mim nunca suspiras

mas das órbitas não movo

em meu giro sempre a sós

água de melancia IV

o sol grande melancia

expele o vento solar

cá na terra a me alcançar

vermelho de nostalgia

porém tua chama é mais fria

e não chega a me cremar

por mais longe a adejar

em teus olhos de folia

a água de melancia

chega encarnada do sol

mesmo assim me dessedenta

na esperança todavia

de um pequeno caracol

que em teus cabelos se assenta

MARIMBAS I (13 NOV 12)

EM SEU TOM UM TANTO ROUCO

DE EMOÇÃO INESPERADA

A MARIMBA AO SER TOCADA

SEMPRE ME PERTURBA UM POUCO

MINHALMA TORNADA EM FLOCO

NESSE TIMBRE EMADEIRADA

EM SÍSTOLE DESCOMPASSADA

DIÁSTOLE EM RITMO LOUCO

A MARIMBA DE TEUS DEDOS

PERCUTINDO AO CORAÇÃO

ENFRENTA A RESPIRAÇÃO

EM PERCUTIR DE SEGREDOS

NAS TECLAS ESTREMUNHADAS

DA TENSA ILUSÃO DOS NADAS

MARIMBAS II

HÁ QUANTO TEMPO ESCOLHI

DOS TÍTULOS EM FILA LONGA

A MARIMBA DA MILONGA

QUE SÓ HOJE EU REDIGI

ANTE O NOME ME ENCOLHI

POIS NÃO SEI DANÇAR A CONGA

E O CORAÇÃO SE ME ENGONGA

DESDE O DIA EM QUE TE VI

MARIMBA DE BEM-TE-VI

NOS CABELOS AS MAROMBAS

NOVAS RIMAS A EXIGIR

AO ZOOLÓGICO EU CORRI

DOS ELEFANTES SUAS TROMBAS

TERMINEI POR LHES PEDIR

MARIMBAS III

MAS NÃO TRATO DE MAROMBAS

ESTE É O CANTO DAS MARIMBAS

EM DESDÉM DE MIM TE VINGAS

POR CANTAR EM RIMAS ROMBAS

SEMIBREVES SEMILONGAS

NO RUTILAR DAS CACIMBAS

NO BALANÇO COM QUE GINGAS

NO CANSAÇO ENFIM QUE TOMBAS

AS MARIMBAS DE AQUIETANDO

AS MAROMBAS RETIRANDO

SOLTANDO OS LONGOS CABELOS

EM TEUS BEIJOS DE RUBI

MOSTRANDO O MELHOR DE TI

NO ESPLENDOR DE TEUS DESVELOS

DESDÉM I (13 NOV 12)

Eu chamo a Lua e a canção desata.

Seresta antiga de álgido fulgor,

Argentina essa luz de meu ardor:

A Lua voga em seu olhar de prata.

Eu chamo a Lua desde longa data:

Amei Selene em seu gélido esplendor...

Pouco a pouco, fui sentindo mais rancor,

Não me responde nunca tal ingrata...

Como se fossem meus versos lenga-lengas

Que apenas se esbatessem em sua face

E retornassem como débil eco...

Fragmentos pervertidos das arengas,

Sem que nada em seu rosto se estampasse

Senão a poeira em cada traço seco...

DESDÉM II

Até que ponto para mim a Lua vem

Quando me banho em seu meigo luar?

Será possível um dia ainda encontrar

Selene, em que tão poucos ainda creem?

Houve tempo, que a memória ainda contém

Em que tantos a invocavam, a adorar,

Deusa de chifres no Crescente amar,

Deusa corcunda no Minguante além...

A deusa negra a que tantos chamam Nova,

A deusa gorda a que chamam Lua Cheia,

Engravidada e fúlgida do Sol...

E a religião moderna não o aprova,

Mas sua luz pálida minhalma ainda incendeia,

Pois quantas vezes lamentei o arrebol!...

DESDÉM III

Contudo, em meus cantos desprezados,

Ainda vejo iluminada a rua

Pelo avarento fulgor da deusa-lua...

Que importa os brilhos sejam emprestados?

Se lá estivesse, albedos encantados

Subiriam desde a Terra, como pua

A perfurar-me os olhos, em que estua

Resto de amor, mal e mal iluminados...

A Lua eu amo, com todo o seu desdém,

Inatingível como o perfeito amor,

Embora a gente se contente com o parcial...

E no entretanto, em sonhos ela vem,

Selene antiga, de sideral candor

E então me ama num orgasmo triunfal!

MISÉRIA I (8/7/2006)

Nem sei por que razão amor perdi:

Era tão forte e cego e afortunado...

Daria tudo só para a teu lado

Poder ficar... Pensava só em ti...

Porém não mais quiseste meu carinho;

Não sei se outro amor te transformou;

Não sei se apenas teu coração mudou

E realmente prefere estar sozinho...

Só sei que a mágoa fundo me tocou,

Amarga e doce como um sonho antigo,

Porque perdi de mim mais que a metade:

Perdi aquela que meu corpo amou;

Mas foi pior, porque levou consigo

Minhalma e não deixou sequer saudade...

MISÉRIA II (13 NOV 12)

Sei muito bem que a alma não pediu,

Pois nem sequer meu corpo desejava;

Mas de seus olhos a luz que me alvejava

Cortou-a depressa e seu cordão puiu.

A alma ficou frouxa e me excluiu:

Foi para quem além de mim se achava;

Fiquei aquém, sem flechas em minha aljava

Para assetear a quem me seduziu...

De certo modo, minha alma me traiu,

Em busca dessa que nem a mim queria,

Ficou-me o corpo, meio desalmado...

Contudo, marchou firme e não caiu,

Conservado pela dor que ainda fulgia

Desse olhar que me deixou atoleimado...

MISÉRIA III

E se não sinto saudade, é que faz parte

Das agruras da alma em desalento;

Com desamor ainda o peito esquento,

Quaisquer amores lançando ao meu descarte.

Ou os aceitando, até que o corpo farte,

Pois sou pobre de espírito e frequento

Apenas carne e nisso me contento,

Feito insensível ao usufruir da arte.

Às vezes, ainda avisto pelos céus

O meu cordão de prata destroçado,

Quando ela voa mais acima, indiferente.

Feito invisível depois, permeio aos véus

De outros cordões de prata, acompanhado

Das pobres almas, que roubou de tanta gente...

MISÉRIA IV

Como é difícil viver, quando é penada

A alma que hoje deveria me animar!

Mil setas forjo, na busca de a alvejar,

Não mais querendo frechar a bem-amada,

Mas tão somente essa alma desolada,

Que de mim deixei fugir, em meu penar,

Sem paradeiro em que possa se alojar,

Que a bela deusa prossegue, desvairada...

Sem nem pensar em mim, sem querer nada,

Dançando apenas no espaço sideral,

Usando almas como o seu tapete...

Também a minha, pobre desgraçada,

Que ao evolar-se, nunca previu o mal

De se esgarçar em poeira de confete!...

VÊNUS CONTAGIOSA I (14 NOV 12)

Quando Vênus me chamou, estava triste

porque eu me alinhara com Anfitrite

e humilhada sentira-se Afrodite,

ao perceber minha razão que a si resiste;

e desse modo, a dominar-me insiste:

por mais que um novo amor ainda evite,

suas gavinhas sutis assim emite,

nessa nova armadilha, em que consiste

toda atração sexual, mesmo platônica

(embora esse termo eu ainda deteste),

seus dedos róseos me acariciando a mente,

para tornar-me a resolução distônica,

lançando aos poucos, para que me infeste,

vírus de amor à medicina resistente...

VÊNUS CONTAGIOSA II

Embora eu não me tenha por poeta,

minhalma em romantismo eivada ainda

encontra linhas de expressão bem-vinda

na menor experiência que me afeta;

e num raio de lua acho completa

essa ilusão de amor, gloriosa e infinda

e uma gota de chuva, sempre linda,

cai sobre a mente e o peito não objeta...

De que modo evitar ser vulnerável

a essas cismas que Vênus me provoca?

Olhos de luz enxergo na alvorada,

antes que o sonho se perca, imponderável;

e é então que Vênus com seus dedos toca

minha resolução e a pulveriza em nada...

VÊNUS CONTAGIOSA III

É nesse breve instante em que o farol

que emerge flébil no raiar do Oriente

ainda não se apoderou de meu presente,

mas Selene já apagou-me o seu anzol...

É quando surge e enfrenta o arrebol

essa estrela matutina descontente

por não lhe dar mais atenção frequente:

é quando Vênus enfrenta o duro Sol

e seu poder se faz mais arbitrário,

luz sideral em seu fulgor plangente,

seus raios doces transformando em setas.

Vésper também tem brilho cinerário,

mas logo surge a multidão pungente

a perfilar constelações completas...

VÊNUS CONTAGIOSA IV

Por isso é Áster, a Estrela da Manhã,

que mais poder exerce sobre mim.

Rei e Rainha já tiveram seu festim,

um ainda fraco e a outra toda vã...

Nesse momento é que se faz mais chã

a Estrela Matutina ante o carmim,

que apenas mostra fímbria carmesim

sobre as nuvens esparsas como lã.

É então, quando ainda estremunhado,

de meus sonhos intensos mal lembrado,

que em mim desperta sua gentil cadência

e o novo dia me parece desolado,

despido de poesia ou de ciência,

por não ter Vênus deitada do meu lado...

VÊNUS CONTAGIOSA V

Pois Anfitrite, a quem dei vassalagem,

a suserana ausente e indiferente,

nem interfere se Afrodite, ingente,

vem conquistar-lhe os servos em miragem.

E é nessa ausência que brilha tal visagem,

contra o fundo das pálpebras bem rente,

esses olhos percebidos na impotente

vida alternada em reino mais selvagem.

É então que bate na prisão dos cílios

essa mulher que Morfeu me apresentou,

ansiada por sair e ser arco-íris...

Mal atenuada pelos solares brilhos,

na breve hora em que Vênus dominou,

quando até esqueço do amor que tu me inspires.

VÊNUS CONTAGIOSA VI

Até que ponto seria uma traição

amar em sonhos a quem nunca se viu?

A voz de Vênus então me perseguiu

nesse momento de menor açodação,

quando Selene já me largou de mão

e quando Hélios mal e mal surgiu,

quando Anfitrite nem sequer sorriu,

quando Afrodite me lança seu condão...

É nesse instante que me torno vate,

sem querer encetar mais aventuras

e me contento em amar sobre o papel,

até que o albor primeiro me combate

e o trabalho me chama a suas agruras,

nesse descarte do amor em doce fel...

RITUAIS I (8/7/2006)

quando voltares e teu rosto Mudo

mostrar todo o desejo que, Contido,

velado fica pelo olhar Retido...

traído fica pelo olhar Desnudo...

que se desloca lento por meus Lábios

e pela cova rasa do meu Queixo,

na tremura dos dedos, quando Deixo

que ergas o teu cálice; dedos Sábios

para o instante das carícias; Disfarçados,

perdidos pelo vinho, nos Desvelos

do líquido encarnado; quais Novelos,

levando à boca fogo em vez de Beijos,

para queimar o fogo dos Desejos,

que enfim acabam todos Confessados...

RITUAIS II (15 NOV 12)

quando voltares e não mais Escudo

te esconda o rosto e o elmo de teus Olhos

levante sua viseira e mesmo os Sólios

de tuas narinas me confessem Tudo;

quando tua língua, punhal Pontiagudo,

abra impaciente a rota dos Escolhos

incisivos de marfim e então revele os Fólios

dos pensamentos de amor com que me Iludo;

quando teus seios se apertem contra Mim,

desnudos de pudor e Vestimentas,

quando nenhum fingimento mais Atentas

para ocultar-me teu desejo, Enfim,

meu corpo inteiro será por ti Queimado,

em fragmentos e cinza Alucinado.

RITUAIS III

quando teu sangue se unir ao Meu,

tua rosa carmesim em suave Torno,

a doçura da concha, em sonho Morno,

bivalve o teu amor que me Prendeu;

quando teu ventre, no instante em que Gemeu,

se abrir inteiro em seu gentil Entorno

e minha vida derreter no manso Forno,

luz destilada a que o óvulo Aquiesceu;

quando sentir o toque dessas Trompas,

falópico clangor de minha Esperança,

nessa possível acolhida de Criança,

que em alguns meses para o mundo Irrompas,

só então eu saberei por que Nasci,

nessa tortura imortal que vem de Ti.

AQUÁRIO VERMELHO I (16 NOV 12)

Até parece que o Sol se encontra fixo,

bem ao contrário das antigas crenças...

Quanta gente pereceu em desavenças,

Aristóteles apoiando o crucifixo!...

Mas hoje na ciência me transfixo

e reconheço as vastidões extensas,

por onde oscilam emoções intensas,

cada planeta não mais do que um prefixo...

Hoje as crianças televisão assistem

ou encontram na Internet outra figura,

tal qual nos mostra também a astronomia...

E nela, esses planetas que se avistem,

marcham em volta de ardente criatura,

em permanência imóvel de magia.

AQUÁRIO VERMELHO II

Portanto, se o sistema ao redor gira,

lá está o Sol, potente em seu vigor,

o rei no trono, o cetro de esplendor,

com sua corona de luminosa espira.

Há quem afirme que em torno a si se vira,

em rotação perene e em longo ardor.

Há quem conteste a rotação do autor

de toda a vida que em seu sistema insira.

Mas quer tenha ou não tenha rotação

(talvez a tenha no universo natural,

e não a tenha em universo paralelo),

lá se encontra, em gigantesca operação

esse gigante de aparência triunfal,

sempre pródigo, porém sempre amarelo.

AQUÁRIO VERMELHO III

E assim se satisfaz o antropocentrismo:

se cada homem não é o centro do Universo,

pois pelo globo todo está disperso

e a própria Terra possui o seu tropismo,

buscando achar a luz no vasto abismo,

que espalha o Sol em energia converso,

somente o astro-rei parece o inverso,

pairando acima de todo o cataclismo...

Não há contudo qualquer consolação,

pois sua imobilidade é só aparente:

também o Sol é um perpétuo vagabundo,

como todas as estrelas também são

e se projeta pelo cosmos, velozmente,

em seu anseio por um centro mais profundo.

AQUÁRIO VERMELHO IV

E lá se vai o Sol, nessa empreitada,

iluminando a escuridão celeste,

a prodigalizar seu facho agreste

por onde passa e não encontra quase nada;

só lança a seu redor véu encarnado

e nele guarda os planetas e os reveste

em seu vento solar, com que os infeste

em seu manto inconsútil e sagrado...

São tantos peixes girando nesse aquário,

planetas e satélites, asteroides,

meteoritos rebeldes, mil cometas,

em suas elipses de voo atrabiliário,

todos contidos em iguais romboides,

seguindo rotas para nós secretas...

AQUÁRIO VERMELHO V

Para onde marcha nosso comandante?

Talvez o enxerguem de lugar distante

e o enquadrem em qualquer constelação...

Talvez o vejam qual solitário grão,

débil faísca ou esplendor gigante,

conforme essa distância que nos dão

eternamente as estrelas entre si,

pontos minúsculos para quem as vê daqui...

Decerto astrônomos, em algum outro sistema,

esquadrinhem o espaço, cena a cena,

buscando vida em triste frustração...

E quando lançam lentes sobre o aquário,

nem veem-lhe os peixes, por ser necessário

um telescópio de mais vasta ampliação...

AQUÁRIO VERMELHO VI

Provavelmente, esses estranhos habitantes

tenham surgido em condições bem diferentes

e em suas pesquisas siderais frequentes

procurem mundos bastante conflitantes

com as condições do nosso, esses gigantes

gasosos ou do que a Terra bem mais quentes

ou então bolas de gelo transparentes,

para nós muito pouco interessantes...

Se nosso aquário encontram, o descartam,

pois seus peixinhos não demonstram condições

de criar vida ou de fora a receber...

E então teólogos e cientistas se repartam

em disputas de acirradas contenções

sobre os destinos de seus sóis sempre a correr...

a borboleta magenta I (17 nov 12)

a borboleta sobre o quebra-luz

seu corpo rosa-choque e suas antenas

apenas pousa, sem sequer vibrar

transfixada em invisível cruz

pousada imóvel, refletindo apenas

o que a vidraça lhe dá de luz solar

a borboleta foi feita quadrialada

asas opacas de esplendor magenta

pontos brilhantes de pendor azul

sobre textura transparente e nacarada

de outro par que o abajur frequenta

no viés manso dessa luz do sul

o quebra-luz de bronze e de cristal

recebe a borboleta em sua campana

está apagado e não lhe causa qualquer mal

a borboleta magenta II

de onde vem a estranha borboleta

por que fresta adejou, por que fissura

esse inseto maior que mariposa?

qual o motivo, qual intenção secreta

que ela trouxe, em seu mistério de ternura

ali aplicada pelos dedos de minha esposa?

eu reconheço que seja artificial

adquirida por entre variedades

empoeiradas de quinquilharias

grande demais para inseto natural

bela demais em sua teia de vaidades

morna demais para minha nostalgia

talvez seja chinesa importação

como essas flores que nunca se emurchecem

em seus vasos de perpétua brotação

a borboleta magenta III

o quebra-luz tem borlas esverdeadas

pingentes púrpura descem desde o teto

entremeados de contas multicores

num ikebana de formas encadeadas

da terra, homem e céu mostram aspecto

em seus orgulhos tão enganadores

contra o pano de fundo do lambril

que reveste as paredes desse quarto

há uma raposa trazida da Bulgária

num toque medieval ou feminil

sobrou a pele apenas desse parto,

morta lembrança de excursão atrabiliária

e a estrutura permanece quieta

dos fogos-fátuos de atento artesanato

transformados em magenta borboleta

a borboleta magenta IV

mas nos ouvidos sussurra a fantasia

foi essa a borboleta de Shanghai

que bateu asas e provocou um tsunami

e espantada com o desastre que ela cria

para as alturas imponente vai

até que a voz de uma mulher a chame

e ela cruza urgente a estratosfera

a atravessar silente os hemisférios

buscando entrar pela fresta da janela

bem recebida após a longa espera

aqui achando repouso e refrigérios

contra o creme da lâmpada amarela

que a borboleta irradiada de mil cores

contempla agora e abençoa alada

esse leito em que adormecem meus amores