Naveguei
Naveguei
Rumava em outros ventos e te vi.
Achei ter te olhado com a admiração passageira dos mortais.
Mas não, mergulhei no ventre do tempo. Em tão grande imensidão.
Num tempo atemporal. Num mundo criado a quatro mãos, e sonhei.
Achei imoral tal sonho. Mas não...
Não é imoral quando um sonho desejo do real, e regado de paixão se entrega ao poder lúdico do poeta.
O poeta...
O poeta que vive distante e próximo de tudo e de todos.
Que vive solitário e acompanhado de suas paixões efêmeras e eternas, também é um Deus, um criador de ilusões.
Vive...
Vive o que sente puramente apaixonado, mergulhado no bálsamo da beleza, na sua diáspora, no convite permanente do perigo para viver a angustia dos covardes, o medo dos fortes, a entrega dos dissimulados, a paixão dos loucos, a descoberta dos navegantes, a ansiedade dos jovens, o beijo dos amantes, a decisão dos fracos, o cárcere da liberdade, o pecado do desejo.
Enfim, a criação genial do homem primitivo moderno.
E tudo porque por te vi.
Não sei por que te vi.
Não só te vi.
Percebi teus pés, tua boca, olhos, mãos, sorriso, lábios, seios, coxas, pernas, colo, pele, cabelo, ventre, áurea, por dentro, e ouvi.
Ouvi muitas canções pensando em ti, e cantei.
Cantei pelas ruas, pelas esquinas, pelas praças, por onde passas
e me atirei no mar.
Naveguei em todas as tuas ilhas, ancorei no cais mais próximo dos teus olhos
e sonhei.
Sonhei porque pensei em flores, e admirava os pássaros quando vi o sol estender as mãos, se entregar à noite iluminada por uma lua vaidosa usando colar e brincos de estrelas.
Sonhei mais e mais.
Te vi banhada em água limpa de cheiro doce, vestindo um arco-íris em véu, e te bebi.
Te bebi com a sede dos desertos, me embriaguei de alucinações ternas, e de cansaço adormeci.
Acordei e não havia nenhum vestígio da tua presença física.
Havia sim, a presença da alma em forma de luz divina.
Incrédulo, acreditei que vivi uma vida com você.
Mas não. Apenas te vi.
Paulo Mauricio