Diário de um sonho
Amar, a devota sensação de sentir o corpo
Tocar a pele quente que incendeia o entardecer
Místico de prazer apesar do ondulatório receio de perder
Porque o dia amanhece e a cama arrefece
Ao compasso do tiquetaque frenético da vida
Sendo os estímulos apenas miragens derretidas
Na imensidão profunda de uma noite escura
Entrelaçada a uma lua cheia de ilusões
Ter, a noção de que nada é o que é
Apenas sombras difusas de um sentimento oculto
Restrito ás paredes de uma alma nua
E sem oxigénio para respirar livremente e voar
Mesmo quando o vento sopra e as asas parecem assobiar
Quando o corpo geme uma canção de embalar
Emotiva e sensual como as ondas de um paixão
Que o mar constrói em cada maré cheia
Revolta e intensa que se desfaz na areia
Sonhar, com o que não se tem
Sabendo que esse nada é tudo o que pode existir
E que a presença é talvez a única esperança
Acalentadora dos sonhos de infância
Que a vida foi corrompendo em ruas lamacentas
Despojos ilusórios de uma constelação
De engrenagens ferrugentas e oxidadas
Cujos sons são prantos do coração alheio
A uma busca existencial de entendimento
Chorar, como forma de desabafar a dor
De sistematicamente pensar e comparar
Os desejos com a realidade cruel e absurda
Sofrimento de uma mente reclusa
Ao destino traçado pelas estrelas
Missão que desatina o coração
Que inquieta o corpo e que sulca no rosto
Estradas criadas pelas lágrimas que teimam em resvalar
Envelhecendo a face de barreiras doridas
Independentemente do passar dos anos
Desistir, e com este pesadelo adormecer
Com a certeza que ao acordar não se sentirá alivio
Só pesar, ao perceber que não foi uma ilusão
E sim a opção sem caminho ou solução
Apenas a lancinante dor de ter de esquecer
A doação que implica cada paixão
E a vontade de gostar daquilo que as decisões
Com a força da tempestade parecem apartar
Insistir, com a certeza de que desistir é a solução
Porque a coragem falta para decidir
E a cobardia é o espelho sem luz
Dos amores e desamores que a vida propõe
Olhar na direcção do entardecer e perceber
Que só resta o corpo enroscado na manta da saudade
Que só sobrevive o choro da desigualdade
Revoltado pela passividade de perder a crença
Simplesmente porque a razão é errada
E o sonho absolutamente certo