SEM RIMA 115.- … lábio... lábios …
Vou permitir-me, linguista reformado,
brincar docemente sobre uma palavra
polissémica (assim dita, segundo pareceres).
A palavra é "lábio", cujo plural, "lábios",
evoca diferentes realidades,
todas carnudas... ou quase todas.
Partes visíveis, de carne meiga
e muito sensível, como tinta em sangue,
que nos distinguem a nós, mamíferos.
Justamente os lábios nos permitem
fazer honra a essa nossa condição
de sugadores e de beijoqueiros.
Contudo, outros lábios sensíveis
são conhecidos e bem amados
e por vezes sorvidos com carinho,
com embebecida deleitação
e até com devoção quase mística.
Lábio pode ser também denominada
a forma que o evoque em qualquer objeto
ainda que seja nem carnudo nem sensitivo.
Mistério das metáforas,
dessa ousadia simplesmente fantasiosa,
que as pessoas temos
e usamos no dia a dia e não ocasionalmente.
Mesmo as feridas, sanguinolentas
ou "sanguino-rápidas", podem dispor
de lábios, inclusivamente formosos.
Lábio também pode ser afetado
pela figura literária que dizem
metonímia ou sinédoque:
Quem ótimo fala, é que frui de lábios
prudentes ou eficazes ou cansativos até.
Até as flores se abrem em lábios,
corados, brilhantes e sedutores.
Contudo, eu prefiro os lábios,
masculinos ou femininos,
indecorosos ou honestos,
que humedecidos beijam
ou ternos se deixam beijar.