A Taça

Uma taça cheia, bem lavrada,

Segurava e apertava nas mãos ambas,

Ávido sorvia do seu bordo doce vinho

Para, a um tempo, afogar mágoa e cuidado.

Entrou o Amor e achou-me sentado,

E sorriu discreto e sábio,

Como que lamentando o insensato:

«Amigo, eu conheço um vaso inda mais belo,

Digno de nele mergulhar a alma toda;

Que prometes, se eu to conceder

E to encher de outro néctar?»

E com que amizade ele cumpriu a palavra!

Pois ele, Lida, com suave vénia

Te concedeu a mim, há tanto desejoso.

Quando estreito o teu amado corpo

E provo dos teus lábios fidelíssimos

O bálsamo de amor longo tempo guardado,

Feliz digo eu então ao meu espírito:

Não, um vaso tal, a não ser o Amor,

Nenhum deus o formou ou possuiu!

Formas assim não as forja Vulcano

Cos martelos finos e sensíveis!

Pode Lieu em frondosos outeiros

P'los seus faunos mais velhos e sagazes

Fazer pisar as uvas escolhidas

E ele mesmo presidir ao fermentar secreto:

Bebida assim não há desvelo que lha dê!

Johann Wolfgang von Goethe, in "Canções"

Zorro Poeta
Enviado por Zorro Poeta em 28/04/2012
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