Paixão Secreta

Acordei com os primeiros pássaros,

já minha lâmpada morria.

Fui até à janela aberta e sentei-me,

com uma grinalda fresca

nos cabelos desatados...

Ele vinha pelo caminho

na névoa cor de rosa da manhã.

Trazia ao pescoço

uma cadeia de pérolas

e o sol batia-lhe na fronte.

Parou à minha porta

e disse-me ansioso:

— Onde está ela?

Tive vergonha de lhe dizer:

— Sou eu, belo caminhante,

sou eu.

Anoitecia

e ainda não tinham acendido as luzes.

Eu atava o cabelo, desconsolada.

Ele chegava no seu carro

todo vermelho, aceso pelo sol poente.

Trazia o fato cheio de poeira.

Fervia a espuma

na boca anelante dos seus cavalos...

Desceu à minha porta

e disse-me com voz cansada:

— Onde está ela?

Tive vergonha de lhe dizer:

— Sou eu, fatigado caminhante,

sou eu.

Noite de Abril.

A lâmpada arde neste meu quarto

que a brisa do Sul

enche suavemente.

O papagaio palrador

dorme na sua gaiola.

O meu vestido é azul

como o pescoço dum pavão,

e o manto verde como a erva nova.

Sentada no chão, perto da janela,

olho a rua deserta ...

Passa a noite escura

e não me canso de cantar:

— Sou eu, caminhante sem esperança,

sou eu.

Rabindranath Tagore, in "O Coração da Primavera"

Zorro Poeta
Enviado por Zorro Poeta em 21/04/2012
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