MORTOS NÃO SONHAM MAIS
De outrora, lembro-me de quando vibrava nos tempos passados meus.
O fulgor e a força desbravadora me cegavam com futilidades avessas.
Como tantos, venci e perdi batalhas numa guerra infinda.
Agora, tudo parece estar sumindo nos campos antes vivos.
Alguns dos outros derradeiros depositam suas esperanças
Em orações ensandecidas, quase ininteligíveis, diante do monstro.
Mas não vou orar em sacrilégio. Não devo me apiedar de mim mesmo.
Apenas por uma brevidade, ao fim do dia, ainda vejo
O pequeno horizonte desaparecendo avermelhado.
A frágil luz do sol, como eu, num último suspiro,
Vai se apagando nas grandes sombras da noite.
Tento elevar o olhar, mas meus olhos pararam no tempo.
O medo me percorre. Não sou mais o mesmo. Agora padeço.
Adoeço. Fraquejo, cambaleio e caio. E não vou suplicar aos deuses.
A dor que de mim e em mim emana é minha julgadora e cruel assassina.
Sinto um frio que congela minha alma. Estou vazio, irrecuperável.
Anoiteço e sumo enlouquecido nas sombras que a tudo devoram.
Queria gritar minha dor e insanidade ao infinito, antes do grande sono.
Não tenho forças. Adormeço debaixo do nada. Sem lágrimas. Insentimental.
Não quero sonhar nada que aprimore alguma vontade qualquer coisa.
A morte, que contempla toda a cena, sorri com um manuscrito em mãos,
Cor de sangue, onde agora gravará a história de minha não vida.
Posso ouvir seus murmúrios quando escreve a primeira frase:
- Por que temes sonhar? Mortos não sonham mais!
Péricles Alves de Oliveira