AMOR NA VAZANTE DA MARÉ
Estás tão próxima e tão longe
Como na realidade imaginaria de uma vitrine
Próxima dos olhos, mas longe do alcance das mãos
E como um narciso moderno acaba beijando
Somente sem nexo pelo vidro o reflexo distante
De meu rosto também imaginário
E como um corsário pirata
Vou tomando navios em mares abandonados
E fincando minha bandeira nestes pobres corações solitários
Sem porto pra atracar!
E tu dentro desta bolha secundária
Como um pássaro sem vida sem uva sem vinha
Vai trocando de roupas como quem troca de penas
Um fantoche bordado na rotina para encher falsas retinas
E minhas asas vão arrastando nas águas que desaguais
Beijando teu retrato desbotado que carrego na algibeira
E de frente pra este mar de saudade na beira do cais
Vou levando minha sereia
Que das minhas ondas cerebrais não sai
Vou carregando sonho e ansiedade
Contando areias na saudade
E os barcos passam engolfados pelo vento
Como acentos na água vão contando causos
Que os pescadores pra passar o tempo inventam
Só a memória inverte esta contra dança
Parando a célere temperança quando
No coração sereno vem a mais linda lembrança
De um amor que um dia foi meu
Que pesquei no arpoador com o arpão de cupido
E por ser eu um homem rústico e das rendas de redes
Ficou na cidade de pedra alegando incompatibilidade
Hoje vive noutro lugar tem seu castelo
E eu fiquei na preamar tendo meu lar como esperança
Quem sabe um dia cortando a garoa ao meio
Eu a tire daquela vitrine de plástico
E arranque este seu frio véu
Fazendo-a viver de verdade lendo o céu
Ao lado deste rústico pescador
Que tem um mar pra lhe cobrir de amor