T R A N S I Ç Ã O

Avantajavam as pernas,

Mal as ocultavam as vestes

Os seios espontâneos

Insinuantes sob o tecido cru

Lábios carnudos e femininos

Explodindo na face morena

Cabelos em desalinho

Revoltos na testa e dorso

Olhos jabuticabas

Matreiros e fascinantes

As formas exorbitando

No corpo modulado de fêmea

As mãos finas e impacientes

Detendo o pudor

Fruta de meia-estação

Borboleta deixando o casulo

Instintos em apuros

Frenesis e torpores

Malícias às escondidas

Sorrisos à mostra

A primeira aventura

Um beijo à socapa, um abraço

A confidência e a descoberta

A imagem vaidosa no espelho

A carta, o bilhete, o flerte

Os projetos e o amanhã

Na lábia das maravilhas

Desejos e receios

A flor beijada pelo inseto

A ânsia e o ato consumado

Amadurecem os sonhos

Livre mariposa, rosa aberta

Ave exigente

De asas adultas

Da pequena restou a meiguice

Da mulher surgiu o sensual

Nas maças das faces,

A chama flamejante

Ardente fogo avassalador

Como rainha subjugou mil súditos

Do forte fê-lo frágil

Fascinado nas carícias

Do macho quedou-se criança

Necessitada de colo

A tantos fez-se desejada

E nenhum a satisfez

Foi Ana, foi Maria

E tantas outras

Fantasia de grandes paixões

Fruta enigma

De todos a mulher

A menina, de ninguém.

( versos meus encontrados em velhos escritos, 1980)